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Benjamin Gallotti e Alexandre Moreira Lopes

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A imunidade recíproca das autoridades portuárias para pagamento do IPTU e a evolução jurisprudencial.

Recente julgamento realizado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), ocorrido em 8 de fevereiro de 2023, vem ensejando dúvidas e insegurança jurídica aos contribuintes vencedores de litígios na justiça, cujas decisões transitadas em julgado deveriam garantir o direito ao não recolhimento de tributos.

Na análise dos temas 881 e 885, afetados por repercussão geral, os ministros do STF chegaram à conclusão de que “as decisões proferidas em ação direta ou em sede de repercussão geral interrompem automaticamente os efeitos temporais das decisões transitadas em julgado nas referidas relações, respeitadas a irretroatividade, a anterioridade anual e a noventena ou a anterioridade nonagesimal, conforme a natureza do tributo”. 

A partir dessa interpretação, o plenário do STF entendeu que, mesmo as empresas que conseguiram na Justiça o direito de não pagar CSLL, deveriam ter retomado o recolhimento da contribuição a partir do ano de 2007, momento no qual o STF afirmou, por ocasião do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 15, que a contribuição era constitucional e deveria ser paga, relativizando os efeitos da coisa julgada.

No que se refere ao setor portuário, o novo entendimento autoriza reflexão acerca da imunidade recíproca conferida às administrações portuárias quanto ao recolhimento do IPTU. A referida imunidade tem origem no julgamento do RE nº 253.472/SP, ocorrido em 02/2011, quando o plenário do STF analisou a possibilidade de extensão da imunidade recíproca tributária às administrações portuárias, garantida aos entes da administração pública direta pelo art. 150, inciso VI, da Constituição Federal.

Em análise, o STF considerou que as administrações portuárias (ou autoridades portuárias) atuam por mera instrumentalidade estatal, na medida em que suas atividades não buscam a satisfação de interesse próprio ou acúmulo patrimonial, tampouco há risco de quebra do equilíbrio concorrencial, considerando que administram os portos em regime de monopólio. Garantiu-lhes, portanto, imunidade em relação ao recolhimento do IPTU, consolidando, todavia, que a exploração de atividade econômica, destinadas ao aumento patrimonial do Estado e de particulares (empresas arrendatárias), devem ser tributadas.

Da análise, sobrevieram desdobramentos. Primeiramente, teve origem o tema nº 385, por meio do qual buscava-se a ampliação do benefício de imunidade do IPTU aos arrendatários de áreas portuárias. Na análise do tema, o STF interpretou ser devida a cobrança do IPTU em face dos arrendatários, fixando a seguinte tese de repercussão geral: “A imunidade recíproca, prevista no art. 150, VI, a, da Constituição, não se estende a empresa privada arrendatária de imóvel público, quando seja ela exploradora de atividade econômica com fins lucrativos. Nessa hipótese é constitucional a cobrança do IPTU pelo Município”.

Um segundo desdobramento pode ser notado pela veiculação do tema 1.140 de repercussão geral, ocasião na qual se discutiu, à luz dos arts. 150, VI, a, e 173, §1º e §2º da Constituição Federal, a possibilidade de aplicação da imunidade recíproca a sociedade de economia mista prestadora de serviço público de transporte de passageiros, observando-se a livre concorrência, o intuito lucrativo das empresas e a cobrança de tarifa dos usuários.

Na ocasião, foi fixada a seguinte tese: “As empresas públicas e as sociedades de economia mista delegatárias de serviços públicos essenciais, que não distribuam lucros a acionistas privados nem ofereçam risco ao equilíbrio concorrencial, são beneficiárias da imunidade tributária recíproca prevista no art. 150, VI, a, da Constituição Federal, independentemente de cobrança de tarifa como contraprestação.” 

Ocorre que, a despeito de um bem definido regime de exploração das administrações portuárias, que consiste especialmente na gestão do porto público da União, com a finalidade de garantir eficiência e tratamento isonômico aos usuários, tem-se observadas alterações nos entendimentos dos Tribunais do país acerca da natureza jurídica das administrações portuárias, afetando, em contrapartida, a garantia de imunidade recíproca até então conferida.

É o exemplo da apelação julgada no processo nº 0003059-89.2013.815.0731, por meio da qual o Tribunal de Justiça da Paraíba recusou o direito à imunidade ao IPTU à administração portuária, ao argumento de que a empresa possui capital aberto na bolsa de valores e, por isso, possui fins lucrativos, enquadrando-se na vedação insculpida no Tema 385.

Ainda que se entenda tratar-se de um posicionamento isolado promovido pelo Tribunal, a autoridade portuária moveu Reclamação Constitucional ao STF que, diga-se, manteve o entendimento, ao fundamento de que a decisão estaria alinhada com a jurisprudência da Suprema Corte.

Diante disso, a reflexão remanesce da evolução jurisprudencial observada sobre o tema, não pela eventual assertividade do julgamento do TJPB e do STF (da qual discordamos), mas especialmente no problema que poderá derivar desta interpretação, sobretudo quando se observa que o Tema 385 foi julgado em 04/2017 e, caso prevaleça a aplicação do tema em relação às administrações portuárias, poderá haver retroatividade da cobrança até referida data, mediante a relativização da coisa julgada. Essa situação de insegurança jurídica é prejudicial aos investimentos em infraestrutura, que, via de regra, exigem longos períodos para amortização, considerando os vultosos valores necessários para a construção de portos/terminais, rodovias e aeroportos.

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TAGS áreas portuárias Constituição Federal Insegurança jurídica plenário do STF Tribunal Federal

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