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Veto ao Reporto será derrubado, garante ministro
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Elogiado pelo setor empresarial, diante dos projetos implantados, destacado por analistas políticos como um dos ministros de melhor desempenho no governo do presidente Jair Bolsonaro, Tarcísio Gomes de Freitas se prepara para deixar a pasta da Infraestrutura. Após três anos em que modificou regramentos, licitou ativos e conseguiu fazer com que o setor portuário passasse a dar lucro, a próxima meta do engenheiro e militar da reserva de 46 anos está no campo político. Quer disputar o Governo do Estado de São Paulo. “Por que não aceitar esse desafio? Eu acho que é um desafio que mexe com qualquer profissional”, afirmou Tarcísio em entrevista exclusiva ao Jornal BE News. Mas antes, ainda têm outros objetivos, como acompanhar a derrubada do veto ao Regime Tributário para Incentivo à Modernização e à Ampliação da Estrutura Portuária (Reporto, que prevê isenções fiscais para investimentos em infraestrutura) e dar continuidade ao processo de desestatização dos portos, cita. Acompanhe a seguir a análise de Tarcísio Gomes de Freitas sobre alguns dos principais projetos em execução no Ministério da Infraestrutura, como será sua transição na pasta e, ainda, como ele conseguiu blindar sua equipe de interferências político-partidárias.
Ministro, realizando um balanço de sua gestão na pasta da Infraestrutura, um dos destaques é a aprovação do Marco das Ferrovias. Quando surgem os primeiros resultados concretos dessa nova legislação?
Os primeiros pedidos de autorização já aconteceram. E nós temos grupos muito importantes no Brasil na área de celulose, de mineração, até operadores ferroviários mesmo, que já fizeram seus pedidos de autorização. A partir do momento em que esses pedidos de autorização são feitos, a gente entra numa fase de elaboração de projeto e obtenção de licença para que esses investimentos comecem. Nós temos um prazo de cinco anos para que se inicie, antes de uma autorização ser cassada. Então eles têm que começar a deslanchar em cinco anos e eu tenho certeza de que muitos, a maioria desses projetos vai deslanchar e a gente vai perceber isso. Isso significa que esses projetos começam a ser implantados em até cinco anos e nós teremos em 15 anos uma mudança de cenário absoluta, com a proeminência muito mais forte do transporte ferroviário, que vai assumir um protagonismo no transporte de carga. Então a participação do modo ferroviário na matriz deve dobrar, deve sair dos atuais 20% para 40%.
Essa duplicação será nesse período?
Sim, em 15 anos. Isso representa, pelo menos é o que nossas simulações mostram, um acréscimo de oferta extremamente importante, muito expressivo. E esse acréscimo de oferta vai representar uma redução de custo-Brasil de 35%, 40%.
Ainda sobre ferrovia, quando deve ser concluída a renovação antecipada do contrato de concessão da operadora ferroviária MRS? Qual a expectativa?
A expectativa é que essa renovação possa acontecer entre os meses de abril e maio. Já está em fase final de análise no Tribunal de Contas da União (TCU). Acho que depois do parecer da área técnica, a gente precisa ver o que é necessário eventualmente ajustar. Isso irá para o gabinete do ministro-relator, que é o ministro Jorge Oliveira. E obviamente tenho certeza de que ele vai dar o máximo de celeridade, em função do compromisso que o TCU tem com o Brasil. Isso não tem sido diferente. O TCU tem sido parceiro, tem acelerado ao máximo a análise de projetos importantes. Então eu acredito que neste primeiro semestre ainda nós teremos o contrato assinado que estarta aí mais de R$ 10 bilhões de investimento.
Entre esses investimentos, está a ferradura do Porto de Santos, que integra a concessão da MRS?
A ferradura está bastante contemplada. Tem uma carga de investimento muito pesada na Ferradura para que a gente possa fazer com que a Ferradura não seja um gargalo, para que a gente tenha fluidez e isso significa, basicamente, ter linhas adicionais e pátios de manobra. Então o investimento em pátio vai ser muito expressivo para que a gente possa ter uma operação mais fluida, mais rápida, mais ágil, com maior eficiência, sem ter que desmembrar trem e para que a gente possa ter uma operação mais automatizada e com trens de maior dimensão.
Outro destaque esperado para o ano é o processo de desestatização portuária, que começa com a Companhia Docas do Espírito Santo, a Codesa, o Porto de Vitória. E depois Santos. Sobre o leilão de Vitória, qual a sua expectativa e qual o perfil dos grupos que o sr. pretende atrair para essa concessão?
A expectativa é a melhor possível. O que a gente tem visto é que a gente está atraindo aquele investidor de longo prazo. Então o que eu espero no Porto de Vitória são fundos de investimento, que farão, por meio de operadores, a operação. Então acho que, no share da companhia, nós teremos alguns dos principais fundos de investimento que operam infraestrutura concorrendo.
Inclusive internacionais?
Inclusive internacionais.
E sobre a desestatização do Porto de Santos, há tempo hábil para se fazer o leilão neste ano?
Há tempo hábil. Veja que nós estamos em um período de consulta pública, que tem um prazo determinado. Obviamente, a gente tem um período aí de resposta a essas contribuições, de análise do modelo, de ajustes no modelo, mas a gente venceu o ineditismo, por que a gente já fez o Porto do Espírito Santo. E uma vez que a coisa não é mais inédita, a gente já deu um passo, fica mais tranquilo a gente vencer isso com velocidade. Então é mais tranquilo para nós fazermos as adaptações. Nós já aprendemos muitas lições no processo do Espírito Santo. E fica mais tranquilo também para os órgãos de controle analisar. Também deixou de ser novidade. Então a gente passa a ter um cronograma com mais governança, com menos possibilidade de susto. Então é perfeitamente possível a gente fazer esse leilão até o final do ano.
Para conseguir fazer esse leilão até o final do ano, tem o período de análise do TCU. Qual o risco de essa análise levar mais tempo do que o esperado pelo Ministério?
É baixo. O TCU, obviamente, vai se debruçar sobre esse assunto. Tem mais complexidade, sem sombra de dúvida, do que o Porto do Espírito Santo. São mais operadores. Nós temos muito mais interfaces. Nós temos muito mais questões relacionadas, que dizem respeito à interação Porto-Cidade. Mas o tribunal tem uma equipe muito técnica, muito profissional. Tem feito isso com muita agilidade. Eles têm um compromisso muito forte com a questão prazo. Como eu falei, como eles se debruçaram na questão do Espírito Santo, existem várias questões do Porto de Santos que são conceitualmente similares, tem um padrão metodológico, um padrão regulatório. Esse padrão regulatório não é muito diferente daquele que a gente teve no porto do Espírito Santo. Então isso facilita muito a análise. Obviamente eles vão se debruçar, mas eu não acredito que leve mais que o tempo que o TCU tem levado rotineiramente em cada projeto, que é o tempo estabelecido na instrução normativa, que é o tempo que está nos nossos cronogramas.
Diante dos interesses manifestados por grupos empresariais, fundos de investimento, pela desestatização do Porto de Santos, qual deve ser o perfil do futuro concessionário do complexo santista? Será semelhante ao de Vitória?
No Porto de Santos, eu vejo um perfil diferente. Eu acho que nós vamos ter um pool, um mix de fundos de investimento internacionais de grande porte, com grandes operadores tanto do agro como de logística, atuando em consórcio.
O sr. vem falando – e acaba de reforçar nesta entrevista – que considera viável a realização do leilão do Porto de Santos neste ano. O leilão sendo realizado, tendo um grupo vencedor, mas havendo uma mudança de governo, o sr. vê algum risco de retrocesso, algum risco de o processo ser cancelado?
Olha, o risco sempre há. Nós estamos indo para uma eleição polarizada. Nós estamos indo para uma eleição polarizada onde nós temos visões de mundo muito antagônicas. Eu entendo que pode haver risco para o processo de desestatização, caso você tenha uma vitória da esquerda. E entendo que se a gente tiver uma vitória do presidente, nós não vamos ter nenhum tipo de solução de continuidade. Porque, de fato, a forma de abordar infraestrutura, de prover infraestrutura, é absolutamente diferente. E a gente, ao longo desses anos, viu o que que dá certo e o que que dá errado.
Sobre uma das contrapartidas do futuro concessionário na desestatização do Porto de Santos, a construção do túnel submerso entre as margens do complexo, quando o sr. acredita que esse empreendimento começa a ser implantado?
Eu acho que tão logo o contrato (de concessão do Porto) seja assinado. E obviamente que a gente tenha projetos e licenças expedidos. Não vejo dificuldade na aprovação de projetos e licenças, até porque trata-se de adaptações de projetos e estudos que já foram feitos ao longo dos anos. E considero também um empreendimento de baixo impacto ambiental, onde o benefício social é muito maior e o balanço ambiental extremamente positivo. Portanto, um empreendimento perfeitamente licenciável. Acho que a gente vai partir para uma concessão da gestão deste túnel, ou seja, vamos contratar um concessionário que vai fazer a obra e a operação. E nós teremos aí um aporte do recurso que virá (com o leilão), que será de responsabilidade do concessionário do Porto. Se a gente misturasse e jogasse a operação do túnel junto com a operação portuária, eu afastaria players que não têm, que não operam com rodovias, que não têm essa como atividade-fim. Então isso afastaria competidores. Mas o que a gente precisa no final das contas é o aporte financeiro. Então eu posso fazer uma concessão com operadores de rodovia e o valor presente líquido estará garantido pelo concessionário portuário. Aí não tem problema, porque é a outorga que o concessionário está pagando, que ele ofereceu. Ele não vai ter o risco da operação. Pagar? Ele não vai ter problema nenhum em pagar. E aí quem vai operar é quem tem expertise nessa área.
Ministro, o sr. comentou que o processo de desestatização também deve viabilizar um espaço para um cais público no Porto.
É importante.
Qual o trecho de cais que será mantido público?
A gente está estudando, mas haverá uma reserva. É importante para a gente atender empresários locais, que fazem essa operação, uma operação em termos de projetos especiais, uma operação que tem lá sua frequência, sua importância. E a gente tem que atender esses operadores. E além de tudo é uma operação que requisita trabalhadores do Ogmo Gestor de Mão de Obra) e isso é fundamental. E, é bom destacar, a gente não está mexendo no Ogmo, a gente não está mexendo na relação capital-trabalho, não estamos mexendo na questão de exclusividade (dos trabalhadores do Ogmo para atuar nos terminais portuários). Essa questão trabalhista caminha à parte. A gente vai fazer a desestatização mantendo tudo aquilo que já está previsto em lei, mantendo a obrigatoriedade da requisição da mão de obra do Ogmo. Mas entendo que o cais público, ele é muito mais interessante do ponto de vista da mão de obra, porque acaba que, nos terminais arrendados, a gente já tem um estoque grande de profissionais vinculados.
Considerando o avanço das negociações para a transferência do Terminal de Passageiros para a região do Valongo, o Cais de Outeirinhos pode ser o local escolhido para o cais público?
A gente vai estudar todas as possibilidades para adequar aquela que seja a ótima, dentro da ótica de desestatização do Porto.
Na semana passada, em uma palestra na seccional de Santos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o sr. destacou que o Ensino Profissional Marítimo está falido. Há alguns anos, empresários do setor defendem que os programas de qualificação para os trabalhadores portuários sejam realizados como no Sistema S, que reúne entidades como o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) e o Serviço Social do Comércio (Sesc). Qual a melhor solução? E diante do seu comentário, teremos alguma medida adotada nesse sentido?
A gente precisa ver qual o melhor caminho. O modelo Sistema S, sem dúvida, é o melhor. O que precisa ver é se tem de ser um Sistema S exclusivo ou se simplesmente coloca no Sistema S que já existe. O setor de transporte tem tido, ano após ano, superávit de recursos e tem estoque suficiente para fazer a capacitação dos profissionais também do setor portuário.
O sr. disse que essa solução para o Ensino Profissional Marítimo passa pelo controle dos recursos. Como seria essa solução?
Eu acho que aí muda a natureza de contribuição e uma parte dos recursos é vinculada a essa nova entidade. E essa nova entidade, obviamente, tem de ter uma pauta de capacitação para esse segmento.
Sua pasta trabalhou bastante para a retomada do Reporto, o regime que incentiva investimentos em infraestrutura, especialmente no setor portuário, a partir da isenção de tributos. Mas o retorno do Reporto acabou vetado pelo presidente Bolsonaro. Atualmente, há uma negociação envolvendo o próprio Planalto para que o Congresso derrube esse veto. O Reporto irá retornar?
Eu acho que sim. Eu acho que o veto ao Reporto vai ser derrubado. O veto não era uma vontade do presidente. Foi um imperativo legal, um imperativo da Lei de Responsabilidade Fiscal. Mas o presidente entende o valor do Reporto para a manutenção do investimento, neste momento em que o investimento vai ser retomado rapidamente, em que a gente está fazendo muitos leilões de arrendamento, em que a gente vai fazer privatização de portos e em que a gente está retomando o segmento ferroviário, que também é beneficiado pelo Reporto. O Reporto é fundamental. Eu entendo que o Reporto deve ser extinto a partir do momento em que a gente tenha uma reforma tributária que reduza a carga em regressividade. Neste momento, ele é uma alavanca para investimento e a perda de receita se transforma em acréscimo de receita pela quantidade de investimento induzido. Então, tenho certeza de que esta é a melhor decisão e, do ponto de vista político, nós já temos um grande acordo para isso.
Sua atuação no Ministério da Infraestrutura é bem elogiada pelo setor empresarial, especialmente por ter implantado gestões profissionais nos portos, afastando as indicações meramente políticas. É difícil blindar os cargos públicos das ingerências político-partidárias?
Quando o presidente é o Bolsonaro, não. Porque é um presidente corajoso, que entendeu que algumas questões são de Estado. A questão de Infraestrutura é de Estado. E que nos deu essa liberdade, nos proporcionou essa blindagem. Então quando você tem um presidente como o presidente Bolsonaro, a gente não teve dificuldade nenhuma para blindar o Ministério e manter a equipe técnica. Se fosse qualquer outro presidente eleito em 2018, nós não teríamos o que temos hoje. A história mostra isso.
O sr. já anunciou que deixará o Ministério da Infraestrutura no final de março, para concorrer ao Governo do Estado de São Paulo. Com a sua saída, essa blindagem permanece?
Sem sombra de dúvida. O presidente permanece e a blindagem permanece. Nós teremos um substituto à altura, que vai ser o meu secretário-executivo, muito provavelmente. Deve ser a escolha do presidente.
Também é a sua escolha?
Também é a minha escolha. Nós tivemos a informação sempre compartilhada e não teremos solução de continuidade nos projetos.
Ministro, por que deixar o Ministério para concorrer ao Governo do Estado de São Paulo?
Eu acho que é uma missão que mexe com qualquer pessoa, profissionalmente falando. A gente está falando do estado que é a locomotiva do Brasil, do estado que acolheu pessoas vindas do Brasil inteiro, estado que representa mais de 30% do PIB brasileiro, que tem muitas oportunidades e que, de certa forma, parou no tempo, por que nós temos aí – são sete mandatos do mesmo grupo, da mesma linha e, com esse tempo todo, acho que se perde um pouco a capacidade de criar, de identificar novas oportunidades, de fazer diferente, de dar soluções para problemas que são recorrentes. Então, de certa forma, é isso que a gente está vendo. E como a gestão do Ministério da Infraestrutura foi uma gestão muito criativa, de muito resultado, a gente percebe que essa criatividade, que essa forma técnica, pode estar a serviço do estado que é o mais poderoso economicamente do nosso País.
Entendo quando o sr. destaca a importância de São Paulo, mas por que resolveu aceitar esse desafio?
Olha, a pergunta é por que não? Por que não aceitar esse desafio? Eu acho que é um desafio que mexe com qualquer profissional. De repente você vê uma janela de oportunidade e, poxa vida, dá para fazer diferente. Eu acho que dá para encarar um desafio desse, ser bem-sucedido e fazer um excelente trabalho.
Qual a sua avaliação sobre o sistema de transportes do Estado de São Paulo? Onde ele pode melhorar?
Eu acho que tem muita coisa para melhorar. Eu acho que tem uma capacidade de geração de receita que não está sendo explorada. Eu acho que a criatividade não está sendo usada, por exemplo, na questão da geração de receitas acessórias, que pode ser uma fonte de financiamento. Acho que como em todo o transporte público brasileiro, existe uma questão de mais transparência na composição dos valores de tarifa, o que implica diretamente na quantidade de subsídio para a manutenção de uma tarifa social. Acho que a gente tem condições de dar um passo a mais nas questões de mobilidade, principalmente na adoção de trens de média velocidade. Tem um campo aberto para isso e a própria prorrogação (do contrato de concessão) da MRS e o Marco das Ferrovias abrem espaço para essa questão. Então tem muitas oportunidades de melhoria, tem muita oportunidade de avanço em todos os segmentos de transporte.
O sr. pretende seguir a prática do presidente Bolsonaro com o Ministério da Infraestrutura e blindar todas as suas secretarias de indicações puramente políticas, caso seja eleito governador de São Paulo?
Sem sombra de dúvida. Esse é o caminho do sucesso. Você não faz nada sem equipe. O segredo de você ter uma gestão bem-sucedida é montar um bom time. E não podemos fazer nada diferente do que nós fizemos no Ministério da Infraestrutura, aquilo que o presidente Bolsonaro tem deixado de ensinamentos e legado – a gestão técnica, que vai nos permitir ter um excelente resultado.