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Luiz Dias Guimarães

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A sina de Jacob no aeroporto

Essa novela adquire nuances bíblicos. Depois de meio século sonhando com um novo aeroporto, Lisboa ganha outro capítulo na definição do aeródromo para substituir os puxadinhos da Portela, o Humberto Delgado, que já não aguenta tantos turistas.

Após um ano de estudos, a Comissão Técnica Independente nomeada pelo governo demissionário do primeiro-ministro António Costa apresentou sua conclusão “provisória”: o melhor lugar para instalar um hub aeroviário é Alcochete, no lado sul do Tejo. Montijo foi descartada sumariamente, para euforia dos ambientalistas.

Mas nada está decidido. O relatório segue agora para discussão pública e será finalizado em janeiro para subsidiar o futuro governo. O líder do PSD, porém, já avisou que seu partido oposicionista criará sua própria comissão.

Segundo os técnicos, o futuro aeroporto custaria oito bilhões de euros, dinheiro de pinga considerando que será custeado pelas taxas aeroportuárias. Levaria ao menos sete anos para ter sua primeira pista. A segunda, mais dois anos. Enquanto isso, Portela continuaria operando. Mas de repente nem seria fechado, então. Como disse a coordenadora da Comissão, “dependerá de várias circunstâncias e incertezas”. E sentenciou: “O futuro o dirá”.

Coitados daqueles que esperam aterrissar seu sonho em novas plagas. Esse assunto me lembra o tapete de Penélope, esposa de Ulisses. Para alimentar a esperança da volta de seus maridos, teciam um grande tapete. Penélope lhes dizia que quando concluíssem o tapete os homens retornariam. Mas durante as madrugadas Penélope desfazia os pontos para que o tapete não acabasse nunca e cessasse a esperança.

Algumas obras são assim. Ao menos em alguns lugares como o Brasil. A Transamazônica e o túnel Santos-Guarujá que o digam. Aqui não é a Catalunha. Certa vez um dirigente municipal de Barcelona, questionado sobre importante obra que transporia seu governo, indignado respondeu: “Na Catalunha os projetos estão acima dos governos”.

Em alguns lugares é assim, como na China, em Singapura e Dubai. Aqui não e em Portugal parece que também não. O primeiro-ministro demissionário, António Costa, criou essa comissão visando uma solução técnica e política, uma vez que acabara de perder seu ministro das Infraestruturas Pedro Nuno Santos, que num belo dia acordou anunciando que não faria um aeroporto, mas dois.

Como uma só comissão é pouca, criou-se também uma segunda, de acompanhamento da primeira.

Lembro que na USP o pessoal brincava que diante de um problema o melhor era sempre nomear uma comissão. E assim empurrar o problema com a barriga. Diante de tantas incertezas, portugueses e turistas devem ficar a ver navios, para não dizer aviões.

Caso prevaleça a decisão em favor de Alcochete, as obras levarão ao menos sete anos, e enquanto isso a ANA, concessionária da Portela, que se vire. O que me faz lembrar o conterrâneo Camões ao celebrizar o poema de origem bíblica: Sete anos a Labão Jacob servia… Sete é sempre um número cabalístico. Completado o tempo, nesse caso, Labão quis entregar a Jacob sua filha Lia. Para ter Raquel, a irmã que ele amava, teria que servir outros sete anos. Parece que Camões inspira ainda hoje as cabeças no Tejo.

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