Os desafios logísticos da Bahia
Uma conjugação de fatores tem feito a Bahia enfrentar, simultaneamente, um conjunto de desafios cuja resolução poderá colocá-la diante de um novo cenário de acelerado desenvolvimento ou condená-la a um longo período de estagnação. Este momento crucial está relacionado com as questões logísticas e de infraestrutura.
Apoiada basicamente em uma extensa malha rodoviária, a Bahia teve a má sorte de ver a única concessão federal existente em seu território submetida ao critério da menor tarifa. Com isto, a modernização necessária foi mandada para as calendas.
Esta inadequada estruturação de projeto trouxe graves danos à Bahia, com reflexos nacionais. É que condenou longo trecho da BR-116 – o principal eixo rodoviário longitudinal do país – e o trecho Feira de Santana-Salvador da BR-324 – o único acesso à capital do Estado e aos portos da Baía de Todos os Santos (BTS) – a não receberem os investimentos indispensáveis sequer para sua conservação e manutenção.
Impressionante é que, decorridos 14 anos do equívoco cometido – em uma concessão de 25 anos – a burocracia nacional não tenha, até hoje, conseguido resolver o imbróglio! Finalmente, fala-se em rescindir o contrato de concessão, a partir do final deste ano. Enquanto isto, a economia e a população baiana sofrem prejuízos irreparáveis.
De resto, a malha rodoviária não tem sido ampliada nem melhorada, como é o caso da BR-242, indispensável para o escoamento dos grãos do Oeste baiano para os portos do litoral do Estado.
Da maior gravidade, e pior ainda, é a situação da malha ferroviária, hoje quase inexistente, apesar de historicamente extensa. O conjunto de estruturas da antiga SR-7 da extinta Rede Ferroviária Federal – que fazia a ligação do Sudeste com o Nordeste do país – encontra-se praticamente desativado.
Depois de 28 anos de abandono, pela concessionária Ferrovia Centro Atlântica (FCA), subsidiária da VLI, conta-se nos dedos de uma mão o número de clientes que ainda resistem, por imperiosa necessidade, a um serviço na velocidade de 11km/hora, transportando volume insignificante de carga, por opção comercial de quem tinha a missão de desenvolver o negócio.
Como se não bastasse, encaminhando a renovação antecipada de sua concessão, a FCA tem o desplante de propor que permaneça no limbo a definição quanto ao futuro do eixo ferroviário principal, de Corinto (MG) a Senhor do Bonfim, que atende à Região Metropolitana de Salvador, ao Polo Industrial de Camaçari e à Baía de Todos os Santos – o maior porto natural do país –, onde existem dois portos públicos e nove terminais privados.
Mais ainda, propõe a devolução de trechos tão importantes quanto Senhor do Bonfim-Juazeiro – que deveria atender ao importante polo de agricultura irrigada do submédio São Francisco – e Esplanada-Propriá (SE) – que fazia a ligação do Sudeste com o Nordeste.
Lamentável é que a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), autoridade reguladora do setor – que tem a obrigação de zelar pelos interesses do país – dê curso a uma proposta desta natureza, que, aliás, encontra-se neste momento submetida a audiência pública.
Em outra frente, a Bahia vive a expectativa de que se concretize a implantação da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (FIOL). Licitada já com 80% de execução, a FIOL I – trecho Ilhéus-Caetité, foi concedida à Bahia Mineração (BAMIN), sendo recorrentes, nos meios econômicos e na imprensa, dúvidas quanto à sua conclusão. Prevista para 2025, fala-se agora em 2027. Estará a ANTT monitorando o andamento das obras?
Paralelamente, a INFRA, empresa do Ministério dos Transportes, já contratou a conclusão da FIOL II – trecho Caetité-Barreiras, passo considerado essencial para viabilizar a concessão conjunta da FIOL II e III com a Ferrovia de Integração do Centro-Oeste (FICO), que se estende de Mara Rosa (GO) a Água Boa (MT) e Lucas do Rio Verde (MT), criando o grande corredor ferroviário transversal que proporcionará o surgimento de uma nova – e mais econômica – alternativa logística para o escoamento dos grãos do Centro-Oeste brasileiro.
Tudo isto depende, inclusive, mas não só, da conclusão do Porto Sul, em Ilhéus, na extremidade Leste da FIOL, também a cargo da BAMIN, que acaba de ter autorizado financiamento de R$4,59 bilhões, do Fundo da Marinha Mercante, para sua implantação.
Como se vê, por sua localização geográfica, a Bahia é passagem obrigatória na ligação Nordeste-Sudeste/Sul do país, assim como do Centro-Oeste para os portos do litoral, sendo inexplicável, ininteligível e inaceitável, a situação crítica em que se encontra, em face do vazio que provoca na integração logística do país.
Embora numa perspectiva de atendimento à demanda presente – que apenas a chegada da BYD já desequilibra –, coube ao setor portuário da Baía de Todos os Santos, romper a inércia que, há algum tempo, tem acometido a economia baiana. Refiro-me à recente inauguração da rota Bahia-Ásia, de frequência semanal, operada por porta-contêineres do tipo New Panamax, com capacidade de transporte de 15.000 TEUs, para os portos de Singapura, de Yantian, Ningbo, Shangay e Qingdao (China) e Busan (Coréia do Sul).
Isto só se tornou possível graças aos investimentos previamente realizados no TECON-Salvador (Wilson, Sons), assim como registram-se outros melhoramentos e ampliações feitas no Temadre (Acelen), no Terminal Portuário Cotegipe (Dias Branco), no Terminal de Granéis Sólidos de Aratu (CS Ports) e no Enseada Terminal Logístico, fortalecendo o Complexo Portuário da Baía de Todos os Santos – BTS-Port.
Converter a Baía de Todos os Santos em um importante a estratégico hub-port para o Atlântico Sul constitui a meta a ser conquistada no desdobramento destes movimentos.
Acresça-se a este conjunto de pendências a indispensável implantação da Hidrovia do Rio São Francisco – cuja gestão acaba de retornar para a autoridade portuária federal na Bahia, a Codeba – uma tradicional e histórica via navegável, e sua integração hidro-ferroviária, em Juazeiro e Bom Jesus da Lapa.
Tudo isto está a exigir uma ampla mobilização, política e social – que ainda não acontece – em defesa dos interesses do nosso Estado, de sua economia e de sua população.