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sexta-feira, 18 de outubro de 2024
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Angelino Caputo

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A hora e a vez do PCS

Estamos diante de mais uma excelente janela de oportunidade para a implantação de PCS – Port Community System no Brasil. Por enquanto, aqui em terras tupiniquins, esse tema tem avançado por espasmos, alternando fases de grande mobilização do setor com períodos de completo esquecimento.

No entanto, as últimas movimentações indicam que só dependemos agora de um engajamento forte das principais lideranças do setor para que, pelo menos no Porto de Santos, tenhamos a primeira implantação de sucesso desse importante mecanismo comunitário colaborativo.

O recente convênio celebrado entre o HUB de inovação do Brasil Export e o MPOr pode ser a gota d’agua que faltava para o sucesso dessa iniciativa. Não porque o HUB do Brasil Export será o líder das discussões ou terá alguma prevalência hierárquica sobre os demais membros da comunidade. Até porque isso esbarraria frontalmente na natureza colaborativa da “Comunidade”. Mas o ecossistema Brasil Export já se consagrou como um ambiente natural de convergência entre os principais atores do setor portuário nacional, podendo perfeitamente ser o ponto de encontro das discussões na fase atual.

Não vale a pena olhar para o retrovisor e ficar procurando explicações sobre as interrupções sofridas pelo projeto até aqui. Mas, na minha opinião, uma fundamentação conceitual forte ainda é necessária para colocar todos na mesma página e evitar que discursos menos estruturados ganhem corpo e dispersem a energia necessária para o projeto.

Por isso, aproveito esse espaço para apresentar uma breve contribuição para essa discussão. A melhor forma de se entender o que é um PCS é entendendo o que não é um PCS.

Para começar, um PCS não é um Sistema de Informática. É muito mais do que isso. Sistema aqui assume seu conceito mais amplo, consistindo em um conjunto integrado de componentes regularmente inter-relacionados e interdependentes, criados para realizar um objetivo definido, com relações definidas e mantidas entre seus componentes e cuja produção e operação como um todo é melhor que a simples soma de seus componentes.

Os componentes do sistema aqui são os membros da comunidade portuária: operadores portuários, retroporto, praticagem, transportadores, rebocadores, amarradores, suprimento de bordo, despachantes aduaneiros, autoridades públicas etc. Seu objetivo definido é fazer o porto funcionar de forma mais segura, rápida e econômica do que qualquer outro porto concorrente.

Já a ferramenta utilizada para agilizar as relações e a troca de informações entre cada um desses membros pode até ser, e normalmente é, uma ferramenta tecnológica, mas só a tecnologia, sem a definição dos modelos de governança, regras para a solução de conflitos, definição dos processos envolvidos, regras de sigilo e segurança das informações trocadas, mecanismos para rateio de custos, entre outros, não traz nenhum resultado para a comunidade portuária.

Aliás, a ferramenta tecnológica do PCS tende a ser muito simples. Comparo ela a um “varal” onde cada membro da comunidade “pendura” seus sistemas próprios, sem qualquer interferência de um membro no sistema do outro. O único objetivo desse barramento, midleware de integração ou conjunto de APIs é a troca segura e acelerada de informações que cada um precisa para melhor desempenhar suas atividades, mas que são originadas em sistemas de outros atores da comunidade.

O PCS é um sistema orgânico que integra uma comunidade portuária. Dizem os especialistas que 80% do esforço para se implantar qualquer PCS está na definição do modelo de governança e no mapeamento dos processos. A ferramenta de TI, que hoje em dia é commodity, representa somente 20% do projeto. Mas já tem muita gente por aí dizendo que tem um PCS pronto para vender para o Porto de Santos. Muito cuidado com isso!

Um PCS também não é mais um sistema de governo, por meio da qual os agentes privados são fiscalizados ou prestam contas de suas atividades. Pelo contrário, um PCS é essencialmente privado e sua premissa é concorrencial, mostrando que o porto, por ter seus principais atores atuando de forma integrada, consegue ser mais eficiente que o porto vizinho. É claro que os órgãos públicos participam diretamente dos processos portuários e são membros da comunidade, porque alguns dos principais processos dependem de informações geradas por esses agentes.

Também não existe PCS nacional. A letra mais importante do PCS é o “C”, a Comunidade. Cada porto possui suas particularidades, que influem na forma como o porto funciona. Santos, por exemplo, é um porto multipropósito, instalado num estuário, tem duas margens e seus acessos terrestres exigem o enfrentamento de uma serra. A solução desenhada para Santos só vale para Santos.

Já a ferramenta automatizada usada em Santos pode até ser a mesma usada em outros portos, assim como se usa a mesma ferramenta de planilhas Excel para diversos fins. Mas mesmo o Excel, sem nenhum conteúdo não serve para nada, assim com uma ferramenta de TI para PCS comprada vazia.

Por fim, o PCS não é um sistema de uso obrigatório. É um ambiente comunitário de adesão voluntária. Atores públicos e privados da comunidade portuária têm que ver vantagem comercial em aderir a esse sistema. Na Europa, onde a maioria dos portos já implantaram seus PCS há mais de 30 anos, as comunidades começaram pequenas, com três ou quatro membros e foram crescendo até envolver a totalidade dos atores envolvidos no funcionamento do porto. Uma boa estratégia para se começar é essa. Pensar grande e começar pequeno, claro que crescendo mais rápido que os primeiros PCS.

E não precisamos começar apenas por Santos. O Porto de Paranaguá já está bem avançado nessa discussão com o apoio da Fundacion Valeciaport. Os portos de Santos, Rio, Suape e Itajaí já tiveram seus processos de: Entrada e Saída de Navios; Importação; e Exportação mapeados e puderam refletir, pelo menos inicialmente, sobre quatro possíveis modelos de governança.

Resta-nos agora resgatar o que já foi feito e dar um novo e definitivo impulso no projeto em tantos os portos quanto forem aqueles que comprarem essa ideia e que certamente colherão os melhores frutos depois da implantação do PCS.

Por isso encerro esse artigo voltando a uma palavra que citei rapidamente lá atras: engajamento. O PCS não tem um único dono. O sistema é da comunidade e a melhor forma de interferir no seu funcionamento e colher os seus resultados é participando da governança. É oferecendo e recebendo dados operacionais de outros atores da comunidade de forma automática e colaborativa, aumentando significativamente a performance do seu negócio e, em consequência, a eficiência do complexo portuário como um todo.

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