Benefícios de um novo marco regulatório para o setor portuário
Por Juliana Oliveira Domingues
Professora Doutora de Direito Econômico, Regulação e Concorrência da USP e membro da Ceportos
Em 2024, foi instalada uma Comissão de Juristas responsável pela elaboração de Anteprojeto de Lei para a revisão do arcabouço legal que regula a exploração direta e indireta pela União de portos e instalações portuárias brasileiras, denominada de “Ceportos”.
Dada a criação de uma Comissão, muitas expectativas surgiram em torno das mudanças direcionadas ao setor. Da mesma forma, alguns que se beneficiam do status quo tem questionado: por que precisamos de um novo marco regulatório?
Em primeiro lugar, vale destacar que a Ceportos, por meio de diversas audiências públicas e trabalhos dos subgrupos criados, tem se dedicado a identificar e buscar alternativas para destravar os gargalos do setor, com a finalidade de aumentar a eficiência operacional dos portos. Somente no primeiro bimestre deste ano, o setor portuário registrou crescimento de 10% da carga transportada em relação ao ano passado (2023). A movimentação de contêineres teve um crescimento acima de 20% no mesmo período. Os dados divulgados pelo Ministério de Porto e Aeroportos ilustram a importância do setor portuário que é responsável por pelo menos 95% do comércio do Brasil. Entretanto, será que não conseguimos outras melhorias e percentuais maiores com mudanças necessárias e condizentes com a realidade do setor?
O Brasil é um país cheio de potencialidades, entretanto, os estudos, dados e contribuições à Ceportos apontam espaços abertos para promover a modernização e para facilitar a expansão dos portos brasileiros.
Não são todos que compreendem que os portos não são estruturas autônomas e, logo, a competitividade depende de fatores que estão interligados. Entender o ecossistema portuário é fundamental, uma vez que existe uma integração da cadeia logística formada pelo transporte rodoviário e, muitas vezes, pelo transporte ferroviário e/ou aquaviário. Soma-se, ainda, a importância dos terminais de armazenagem e das atividades relacionadas com as importações e exportações.
Diante da relevância do setor são atraídas as competências de diversos órgãos públicos que regulam, ou fiscalizam, os serviços portuários. Dentro das inúmeras atividades, emergem preocupações em torno das questões ambientais, dos temas e questões tributárias e alfandegárias, fora um recorrente apelo em torno de problemas notáveis no Brasil relacionados com a segurança (não apenas das cargas) e questões sanitárias.
Englobar todos esses “ecossistemas” que compõe o setor é fundamental, especialmente quando analisamos mecanismos disponíveis para imprimir maior concorrência e melhorias regulatórias. Quando avaliamos a competitividade de um porto é preciso considerar a necessidade de eficiência operacional e a integração dos elos da cadeia produtiva. Um porto deixa de ser competitivo se não tiver à disposição dos stakeholders processos que facilitem o transporte das cargas ou a armazenagem dos produtos.
Nesse contexto, uma importadora de commodities, por exemplo, provavelmente se baseará em dados e informações sobre o ecossistema portuário ao considerar o custo da operação logística e eficiência dos serviços. Da mesma forma, a depender do produto, avalia-se a necessidade de outros modais de transporte.
Em um país de dimensões continentais, com uma extensão costeira de 7637 km de linha de costa (e praticamente 8500 km se considerarmos as baías) e com uma população que se insere entre os 10 maiores mercados consumidores do mundo, temos desafios naturais que precisam ser vencidos, tais como a excessiva burocratização e o chamado custo Brasil.
O ambiente regulatório Brasileiro foi analisado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), em 2022, e o relatório foi assertivo ao identificar que somos menos abertos ao comércio e ao investimento que, por exemplo, o Chile, a Colômbia e a Costa Rica. Em um cenário de tantas potencialidades, chama a atenção os indicadores com desempenhos baixos do Brasil no transporte marítimo.
Vale observar que a Antaq indica que hoje temos, no Brasil, pelo menos 36 portos organizados de navegação, movimentação de passageiros ou de movimentação e armazenagem de mercadorias. Além disso, contamos com 223 terminais de uso privado (os chamados TUPs) que são instalações portuárias que podem ser exploradas por meio de autorização e estão localizadas fora da área dos portos organizados.
Em relação aos nossos portos, o crescimento das movimentações portuárias e do comércio incentiva um marco regulatório que favoreça investimentos. Outros diagnósticos apontam a necessidade do aumento da capacidade de movimentação de cargas e do despacho das mercadorias para os modais de transporte terrestres.
Assim, a criação da CePortos foi fundamental para garantir um olhar técnico, cuidadoso, diverso – em um ambiente democrático de troca de ideias – para enfrentar os problemas da realidade, especialmente diante de diagnósticos recentes que destacam que precisamos de melhorias. É importante trabalharmos para o desenvolvimento econômico do Brasil e do setor marítimo e portuário. A modernização e a convergência regulatória é fundamental para criarmos um ambiente favorável ao investimento, com mais segurança jurídica, menos burocracias e trazendo competitividade que respeite a atuação interinstitucional das autoridades, garantindo espaços para dispositivos mais transparentes e voltados a eficiência econômica.