As dificuldades impostas pelo governo Trump podem beneficiar o Brasil. Elas podem levar a União Europeia a acelerar a aprovação do acordo de livre comércio com o Mercosul (Foto: Reprodução/The White House)
Internacional
O que o Brasil pode esperar do novo governo Trump
Especialistas ouvidos pela TV BE News analisam cenários que vão de retaliações tarifárias a novas parcerias internacionais
Donald Trump tomou posse na segunda-feira (20) para seu segundo mandato como presidente dos Estados Unidos, gerando expectativas e preocupações no cenário internacional. Especialistas ouvidos pela TV BE News analisaram os possíveis impactos das políticas de Trump sobre o Brasil. Entre os principais pontos discutidos, estão as ameaças de novas taxações sobre produtos do Brics, a possibilidade de retaliações comerciais e as consequências de seu governo para o comércio bilateral entre brasileiros e norte-americanos.
O Brasil não tem livre comércio nem fronteira com os Estados Unidos. Mesmo assim, já foi citado nominalmente por Trump como um país que taxa demais. No primeiro mandato, o presidente norte-americano chegou a taxar o aço e o alumínio do Brasil. Se levar adiante essa promessa, as consequências para o Brasil seriam inflação e alta nos juros.
Ao comentar a postura do governo Trump em relação ao Brasil, José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), ressaltou que, até o momento, as ações do novo presidente têm sido mais simbólicas do que efetivas. Ele utilizou uma expressão popular para descrever a situação, destacando a percepção de incerteza quanto a mudanças futuras.
“Acho eu que o Trump, politicamente, não deve adotar alguma medida contra o Brasil. Ou pelo menos adote uma medida simbólica para dizer que ‘o Brasil existe, eu sei que está ali’. A gente costuma dizer no interior de Minas que cão que ladra não morde. Por enquanto nós estamos vendo o Trump apenas latir, sem morder. Pode ser que ele resolva mudar de posição, mas, por enquanto, é mais um rosnado e não passa disso”.
O professor de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB), Robson Valdez, analisou o impacto das medidas econômicas adotadas por Donald Trump durante seu primeiro mandato (2017-2021). Ele enfatizou como as tarifas impostas pelos Estados Unidos ajudaram a reduzir o déficit comercial e influenciaram os norte-americanos na última eleição, realizada em novembro de 2024.
“Vale lembrar que o governo Trump no seu primeiro mandato conseguiu recompor um déficit comercial em favor dos Estados Unidos da ordem de US$ 200 bilhões por meio de tarifas. Então, isso teve um apelo muito grande no eleitorado em geral. E nessa eleição de novembro teve um impacto profundo inclusive em estados tradicionalmente vencidos por candidatos democratas”.
Donald Trump inicia o segundo mandato num momento em que o Brasil vende mais para os Estados Unidos. No ano passado, o país exportou o equivalente a US$ 40,3 bilhões, o maior valor da história do comércio entre os dois países. Um aumento de 9,2% em relação a 2023 e de 27% em comparação com 2019, antes da pandemia de Covid-19.
Mesmo assim, o Brasil comprou mais dos norte-americanos no ano passado: US$ 40,7 bilhões, ou seja, US$ 400 milhões a mais do que foi exportado. Esse déficit na balança pode tirar o país do foco de Trump em uma possível retaliação, ao menos no início de seu mandato.
O maior risco para o Brasil surge se o presidente decidir taxar em 100% os produtos do Brics, particularmente caso o grupo de economias emergentes formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul opte por criar uma moeda própria.
“Brasil e China, por exemplo, já realizaram transações comerciais usando moedas locais”, lembra Robson Valdez. “Então, acho que é preciso tomar um pouco de cuidado, e ter tranquilidade também, para ver até onde vai o discurso do Trump, qual a intensidade e a motivação que ele vai ter para impor toda essa série de tarifas que ele vem prometendo não só ao Brics, mas também ao México, à União Europeia”.
Oportunidades
Por outro lado, as dificuldades impostas pelo governo Trump podem beneficiar o Brasil. Elas podem levar a União Europeia a acelerar a aprovação do acordo de livre comércio com o Mercosul. Além disso, as barreiras comerciais dos Estados Unidos podem abrir espaço para um aumento nas compras asiáticas de produtos brasileiros, como já ocorreu na primeira gestão do presidente.
Lívio Ribeiro, pesquisador da FGV Ibre e especialista em consultoria econômica, destacou como a dinâmica comercial global abriu novas oportunidades para o Brasil no mercado chinês de milho. Ele explicou que a entrada do Brasil nesse setor foi impulsionada pelas tensões comerciais entre Estados Unidos e China, evidenciando mudanças recentes no cenário internacional.
“O mercado chinês não era aberto para o milho brasileiro. E como uma retaliação às tarifas impostas pelos Estados Unidos frente aos produtos chineses, o milho americano foi deslocado e o Brasil entrou nesse mercado. Esse mercado inexistia há cinco, dez anos”, disse Ribeiro.
Durante a reunião ministerial realizada na segunda-feira, em Brasília (DF), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) reiterou que o Brasil busca harmonia com o novo governo norte-americano.
“Tem gente que fala que a eleição do Trump pode causar problemas para a democracia mundial. O Trump foi eleito para governar os Estados Unidos. Eu, como presidente do Brasil, torço para que ele faça uma gestão profícua, para que o povo brasileiro e o americano melhorem, e para que os americanos continuem a ser o parceiro histórico que é do Brasil”, disse Lula.