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As ilhas de calor que nos rodeiam

Atualizado em: 9 de novembro de 2024 às 9:29
Ivani Cardoso Enviar e-mail para o Autor

Maria de Fátima Andrade/Foto: Arquivo Pessoal

Há mais de 30 anos a física Maria de Fátima Andrade, professora do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP, estuda a poluição do ar. Ela faz parte de uma equipe de pesquisadores que na revisão de 202 artigos científicos verificou que é possível conseguir um resfriamento de até 5 graus Celsius da temperatura do ar com as chamadas Áreas de Infraestrutura Urbana verde-azul-cinza (GBGIs) para amenizar as chamadas ilhas de calor. Essas áreas incluem jardins botânicos, parques verdes, rios e lagos, entre outras. Os resultados do trabalho foram publicados em artigo da revista científica The Innovation. Confira:

Como começou a pesquisa?

Esta pesquisa teve origem em uma colaboração com a Universidade de Surrey [Reino Unido], por meio do professor Prashant Kumar, que coordenou o estudo e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP. O trabalho integrou instituições de diferentes países, em vários continentes, que têm desenvolvido projetos em temas ligados à poluição do ar e outras questões da urbanização, como a ilha de calor urbana. Nas cidades com elevado grau de urbanização, onde a temperatura é mais alta do que em regiões rurais próximas, o local é classificado como ilha de calor.

Quais as principais cidades do Brasil classificadas como ilhas de calor?

Várias cidades sofrem com o processo de ilha de calor devido à modificação da superfície urbana. Os trabalhos são realizados com base em dados de satélite, tipo de superfície, e análise de temperatura durante o dia e à noite, considerando as diferenças entre as áreas mais urbanizadas e a periferia.

Qual é o modal mais poluidor?

Nas áreas urbanas brasileiras, o setor de transporte é o maior responsável pela poluição do ar, principalmente em relação ao material particulado fino (MP). Nesse cenário, os veículos a diesel, como ônibus e caminhões, são a principal fonte de emissões desse poluente, que é altamente prejudicial à saúde humana e ao meio ambiente.

E os navios?

Estudos também mostram que os navios desempenham um papel relevante na emissão de poluentes atmosféricos, especialmente em áreas portuárias ou regiões próximas às costas. A emissão de poluentes pelos navios é intensificada pela falta de regulamentação rígida quanto ao uso de combustíveis mais limpos, o que permite que combustíveis pesados, ricos em enxofre, sejam amplamente utilizados. Esses combustíveis resultam em altos níveis de emissões de dióxido de enxofre (SO₂) e material particulado, agravando a poluição e impactando negativamente a qualidade do ar nas áreas costeiras.

O que poderia reduzir o problema?

Regulamentações mais rígidas para combustíveis marítimos, como as implementadas em algumas regiões do mundo, poderiam ajudar a reduzir significativamente esses impactos, promovendo o uso de combustíveis de baixo teor de enxofre e incentivando tecnologias mais limpas no setor de transporte marítimo.

As recomendações dos estudos serão enviadas para os municípios?

Integramos um Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia, o INCT Klimapolis, que tem como objetivo trabalhar com os municípios e a população em temas relacionados com a questão ambiental, incluindo qualidade do ar, uso de soluções baseadas na natureza, recursos hídricos, entre outros.

Quais é o maior desafio?

É incorporar o conhecimento científico nas agendas políticas e mostrar que o resultado de médio e longo prazo resulta em ganhos de qualidade de vida, incluindo ganhos econômicos.

As empresas poderiam de alguma forma fazer sua parte?

A participação das empresas é essencial pois elas podem incorporar novas tecnologias voltadas à redução de emissões e preservação do meio ambiente.

Como o mar entra nesses estudos?

Embora o mar não seja o meu foco principal de estudos, a preservação dos oceanos é crucial para o equilíbrio ambiental. Os oceanos desempenham um papel central na regulação do clima global e são os maiores reservatórios de carbono do planeta. As mudanças climáticas afetam diretamente a temperatura, a salinidade e a biodiversidade marinha. Assim, para estudar o clima, é fundamental considerar as interações entre o oceano e a superfície terrestre, pois essas dinâmicas influenciam intensamente os padrões climáticos e a saúde dos ecossistemas globais.

Em que locais o impacto é maior?

O impacto ambiental tende a ser mais intenso em grandes cidades, onde a ocupação desorganizada das periferias afeta o uso do solo, a disponibilidade e qualidade da água, e a qualidade do ar. Essas áreas sofrem com construções irregulares e falta de planejamento, o que leva à perda de áreas verdes e à poluição dos recursos hídricos e atmosféricos.

Quais as providências necessárias?

Para minimizar esses impactos, é essencial melhorar as condições habitacionais, com construções que ajudem a reduzir o calor e o consumo de energia. A regularização das ocupações e a preservação de áreas verdes também são fundamentais, pois ajudam a manter a biodiversidade e a melhorar a qualidade de vida da população, além de reduzir o efeito de “ilhas de calor” urbanas, comuns em áreas densamente ocupadas sem vegetação adequada.

Como vê o Brasil na questão da preservação ambiental?

O Brasil ainda enfrenta desafios significativos nessa área. É necessário que os padrões de qualidade do ar se tornem mais restritivos, enquanto o monitoramento e controle da qualidade da água precisam ser aprimorados. Em muitas praias, a balneabilidade não atende aos padrões adequados, refletindo a falta de ações eficazes na preservação de ecossistemas como os manguezais, que são vitais para a biodiversidade. Além disso, a poluição dos rios por esgoto doméstico e industrial é um problema recorrente.

Há muito pela frente, não?

Embora algumas cidades estejam tomando medidas mais cuidadosas em relação à preservação ambiental, há um longo caminho a percorrer. É fundamental que essa agenda seja incorporada nas escolas e promovida entre todos os setores da comunidade para que o cuidado com o meio ambiente se torne uma prioridade compartilhada.

 

 

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