A regulação portuária das indústrias de hidrogênio verde
Atualmente, muito se debate sobre a importância do hidrogênio verde, o combustível do futuro, à economia no Brasil, como uma nova forte fonte energética. Para garantir o aspecto verde, enquanto fonte de energia sustentável, até o meio de transporte do hidrogênio é considerado.
O hidrogênio verde é considerado como uma possível solução de baixo carbono plenamente aplicável às indústrias com alto consumo energético. São inúmeras as possibilidades e benefícios, sem mencionar que envolve uma fonte de energia sustentável.
Os investimentos anunciados para construção de usinas produtoras de hidrogênio verde (H2V) no Brasil já somam mais de US$ 22 bilhões. De acordo com o Hydrogen Council (2022), o hidrogênio precisa crescer sete vezes para apoiar a transição energética global, chegando a representar 10% do consumo total de energia até 2050.
Diante de sua notória relevância, o hidrogênio verde foi inserido na matriz energética brasileira após a publicação da Lei n.º 14.498/2024, que dentre outras coisas instituiu a Política Nacional do Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono.
Considerando a crescente demanda, indústrias de hidrogênio verde vêm buscando espaços em áreas portuárias. A referida procura considera de forma estratégica fatores como a localidade, logística de exportação, existência de Zona de Processamento de Exportação (ZPE), proximidade de polos industriais, além da capacidade da região no desenvolvimento de energias renováveis.
Portanto, não há como se fomentar a indústria de hidrogênio verde sem um planejamento regulatório portuário, através da ocupação de uma área dentro do porto organizado de forma segura.
Para a identificação da área mais apropriada, considerando os fatores acima, são necessários estudos iniciais, incluindo a viabilidade operacional, logística, ambiental e econômica, além da disponibilidade de áreas portuárias localizadas de forma estratégica. E no caso de indústrias de hidrogênio verde, será necessário apresentar o Estudo de Análise de Risco (EAR), para avaliação da vulnerabilidade do empreendimento e da região em que está localizado, incluídos técnicas de identificação de perigos, estimativas de frequência de ocorrências anormais e gerenciamento de risco.
Primeira etapa é a identificação no Plano de Desenvolvimento e Zoneamento do Porto (PDZ) se há área que pode ser destinada a determinado fim, bem como se está caracterizada como afeta ou não às operações portuárias em exploração indireta, o que irá alterar significativamente o modelo regulatório que poderá ser adotado.
As áreas não afetas à operação portuária são as localizadas dentro da poligonal do porto organizado que, de acordo com o PDZ, não é reservada ao exercício das atividades de movimentação de passageiros, movimentação ou armazenagem de mercadorias, destinadas ou provenientes de transporte aquaviário, incluindo as de caráter cultural, social, recreativo, comercial e industrial.
A definição se o empreendimento de hidrogênio verde, mesmo havendo notória atividade industrial, pode se enquadrar como área afeta ou não às operações portuárias dependerá de uma análise casuística, a depender do projeto e das atividades a serem desenvolvidas dentro do porto organizado, além da previsão e destinação do PDZ.
Assim, caso haja a caraterização como atividade operacional, ou seja, afeta às operações portuárias, restam dois modelos exploratórios que podem ser empregados, considerando ainda o hidrogênio verde como uma possível “carga não consolidada”. Assim, seria plenamente aplicável o Contrato de Uso Temporário, a curto prazo, ou o Contrato de Arrendamento, a longo prazo.
Destaca-se de forma breve o Decreto n.º 10.672/2021, que regulamenta a possibilidade dispensa de licitação de arrendamento portuário e os procedimentos e condições para o uso temporário de áreas e instalações portuárias localizadas na poligonal do porto organizado, conforme Lei n.º 14.047/2020.
Entre os institutos regulamentos pelo Decreto n.º 10.672/2021, há a possibilidade de dispensa de licitação de área no porto organizado quando existir um único interessado em sua exploração. Para tanto, basta que a autoridade portuária realize chamamento público e o novo empreendimento possua conformidade com o PDZ do porto.
Além disso, foi regulamentado regime de uso temporário para exploração de áreas e instalações portuárias, permitindo-se explorar terminal portuário por um prazo improrrogável de até 48 (quarenta e oito) meses.
O uso temporário de áreas e instalações portuárias deve envolver a movimentação de cargas com mercado não consolidado, sendo essa considerada quando a mercadoria não movimentada regularmente no porto organizado nos últimos cinco anos e que tenha demandado, em média, menos de uma atracação mensal no mesmo período. Da mesma forma, essa utilização deverá estar compatível com o PDZ aprovado pelo poder concedente.
Todavia, por envolver atividade industrial, a indústria de hidrogênio pode ser caracterizada como atividade não operacional, ou seja, como não afeta às operações portuárias. Desta forma, o modelo regulatório poderá ser desenvolvido através de um contrato de cessão portuária, conforme Portaria do Ministério dos Portos e Aeroportos n.º 51/2021.
A cessão deverá estar embasada por estudos simplificados que abrangem a análise de viabilidade técnica e ambiental, que contemplem a apresentação do empreendimento, o valor estimado global e por metro quadrado a serem auferidos pela administração do porto organizado na cessão, quando onerosa; e análise de viabilidade técnica, além, agora, do EAR.
Considerando a notória importância para o Brasil, não pairam dúvidas que os portos brasileiros devem acelerar a corrida para o desenvolvimento do mercado de hidrogênio verde em áreas do porto organizado. Ainda mais após a vigência da Lei n.º 14.498/2024, que instituiu o Regime Especial de Incentivos para a Produção de Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono (Rehidro), com a suspensão do PIS/Cofins na aquisição interna e importação de máquinas, equipamentos e serviços essenciais para a infraestrutura de projetos de hidrogênio.
A instalação de uma indústria de hidrogênio verde pode ampliar a rede de negócios de um determinado porto, com destaque à exportação, além de suprir a demanda de empresas locais e instaladas no porto e na região. Da mesma forma, o desenvolvimento de empreendimentos sustentáveis segue a linha da Governança Ambiental, Social e Corporativa (ESG) na área portuária.
No mais, nítida a necessidade de celeridade e desburocratização da contratação de áreas portuárias, com vistas a atender o mercado, conforme pontuado, caso haja apenas um interessado, devendo ser aberto chamamento público, com possível dispensa de licitação.