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Adilson Luiz Gonçalves

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Cluster de Robótica e Automação em Santos

Em contatos que venho mantendo com membros do Ministério dos Portos e Aeroportos (MPor), da Infra S.A., do Conselho Nacional de Zonas de Processamento de Exportação (CZPE) e do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), sobre a ZPE em Santos, todos a consideram estratégica para o Brasil.



Desde 2017, venho estudando e debatendo a criação de uma zona de processamento de exportação (ZPE) em Santos (SP), bem como a disseminação desse modelo no Brasil, como indutor de desenvolvimento socioeconômico e tecnológico. A proposta de reindustrialização/neoindustrialização só veio agregar valor a essa argumentação.

Em contatos que venho mantendo com membros do Ministério dos Portos e Aeroportos (MPor), da Infra S.A., do Conselho Nacional de Zonas de Processamento de Exportação (CZPE) e do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), sobre a ZPE em Santos, todos a consideram estratégica para o Brasil.

A legislação inerente não define área mínima para terrenos, porém as ZPEs existentes e autorizadas no Brasil têm considerado terrenos não edificados e distantes de áreas urbanas, onde grande parte da infraestrutura de acesso e utilidades precisa ser implantada, ou seja, o CAPEX é elevado.

A revisão feita em 2021 possibilitou a descontinuidade de áreas da ZPE, desde que a distância máxima entre terrenos seja de 30 km. Salvo engano, não consta que as áreas adicionadas precisem ter instalações próprias para a Receita Federal, embora também sejam alfandegadas, para se caracterizarem como integrantes da ZPE.

Essa nova versão também permitiu que as ZPEs sejam autorizadas à iniciativa privada, sendo a de Aracruz/ES o primeiro exemplo, com obras bem adiantadas, incluindo um terminal portuário e o acesso a ele. Assim, qualquer interessado privado pode encaminhar pleito para autorização de uma ZPE, desde que possua terreno próprio, um projeto industrial associado e um Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental que os considere. Obviamente, a área deve ser compatível com a legislação municipal de uso e ocupação do solo, ou haverá necessidade de adequações, se a compatibilização for viável.

É importante destacar que nem todo o projeto industrial demanda grandes áreas, e o ideal é que a ZPE seja concebida como um complexo que envolva atividades industriais, logísticas e de serviços. Como o foco primordial, mas não exclusivo, é a exportação, a proximidade de portos e aeroportos é fundamental para reduzir os custos logísticos e de produção.

Santos e região possuirão os dois, quando o futuro aeroporto de Guarujá (SP) estiver apto a operar cargas. Contudo, o Porto de Santos, isoladamente, já é um superlativo trunfo logístico, situado no estado mais industrializado, desenvolvido e economicamente pujante do Brasil, além de principal mercado consumidor. Tal condição não pode, nem deve ser considerada como zona de conforto. É preciso explorar e ativar todo o potencial identificado, o que exige constante inovação, modernização, reinvenção e atratividade. Isso é de interesse estratégico para o Brasil, e vale para todos os estados, pois as atividades industriais geram empregos diretos e indiretos qualificados, que tendem a reduzir a dependência de programas sociais; e cujas compensações e tributos potencializam recursos para investimentos na área ambiental.

Conforme essas premissas, nos contatos que mantive com os entes federais mencionados, ponderei que a revisão do Plano Nacional de Logística 2035 precisa identificar o potencial de implantação de atividades industriais próximas a portos e aeroportos, de modo a embasarem a elaboração de planos mestres e planos de desenvolvimento e zoneamento (PDZ). A ideia é que, além de avaliar a logística necessária para trazer commodities do interior para o sistema portuário, seja considerado o potencial de produção de cargas de maior valor agregado, tecnologia e baixo impacto ambiental que diversifiquem nossa carteira de exportações.

Exportar em quantidade é bom e o Brasil faz bem isso com suas commodities. No entanto, nossa participação no comércio internacional varia em torno de 1%. 

O ranqueamento de portos é baseado na movimentação de contêineres, que normalmente levam cargas de maior valor agregado, e não na tonelagem.

Exportamos granéis vegetais e minerais, para importarmos produtos industrializados feitos a partir deles, ou de alta tecnologia, pagando muito mais caro. O resultado é nossa crônica dependência tecnológica.

Daí a reindustrialização/neoindustrialização ser corretamente considerada estratégica pelos governos Federal e Estadual, exigindo a modernização da indústria nacional, o que passa inexoravelmente pelo incremento da automação, que está diretamente ligada à competitividade comercial, interna e externa, e, mais ainda, com o desenvolvimento tecnológico característico de nações de “Primeiro Mundo”.

Seria possível produzir, aprimorar, inovar e criar esses equipamentos e seus sistemas aqui, e parar de correr atrás da cenoura ou do próprio rabo? Alguns países fizeram isso em relativo curto espaço de tempo.

A partir da decisão estratégica de investir em desenvolvimento tecnológico, a China deixou de ser um país atrasado, para se tornar uma potência industrial e econômica. Para isso, investiu pesadamente em P&D, formação e qualificação profissional, além de implantar centenas de zonas econômicas especiais, equivalentes às nossas ZPEs.

A Coreia do Sul é outro exemplo, ainda mais relevante pelo fato de ser uma democracia. 

Podemos seguir um caminho similar, mas também é preciso racionalizar nossa legislação, reduzindo burocracias e flexibilizando e agilizando licenciamentos ambientais.

No caso específico de Santos e região, várias são as atividades industriais com potencial para integrar um projeto de porto-indústria, com ou sem ZPE, as quais já foram relacionadas em vários eventos e artigos. Destaco dois itens: drones e equipamentos para cidades inteligentes, todos de alta tecnologia, alto valor agregado e baixo impacto ambiental em sua produção. Salvo engano, atualmente eles são majoritariamente – se não totalmente – importados.

Esse tipo de produção industrial não demanda necessariamente grandes áreas, e o fato da legislação de ZPE permitir que estas sejam descontínuas abre uma nova perspectiva, em minha opinião: a de uma ZPE urbana, que pode ser híbrida, pública e privada, o que pode e deve ser considerado no escopo do marco legal. No caso de Santos, terrenos ociosos e edificações existentes no Valongo, Centro e Paquetá podem ser uma opção. É importante destacar que o Parque Tecnológico de Santos, cuja sede fica em terreno municipal, num imponente prédio de sete andares, inclui mais cinco bairros do entorno urbano, além de terreno greenfield na área continental do Município. Aliás, tais bairros são objeto de propostas de repovoamento e revitalização. Tanto a população existente como a nova poderiam ser qualificadas para atuar nesse tipo de atividade, aproximando moradia e trabalho, com resultados socioeconômicos e urbanísticos bastante interessantes. No mais, eles distam menos de 30 km entre si e da Alfândega de Santos, o mesmo valendo para a área continental, que poderá sediar plantas industriais de maior porte. As instalações poderiam ser alfandegadas, sem a necessidade de instalações próprias, individuais, para a Receita Federal, ou, ao menos, não de grande porte. A ver.

A partir dessas considerações, Santos e sua ZPE têm potencial para configurar um “cluster” de robótica e automação!

Aos drones (aéreos e subaquáticos), equipamentos para cidades inteligentes (sensores, atuadores, etc.) – produção já considerada como possível vocação para a ZPE de Santos – poderão ser agregados robôs com múltiplas funcionalidades, o que também propiciará o desenvolvimento de implementos, aplicativos e sistemas de automação. Em tese, seriam novas atividades industriais diretamente associadas a P&D, retendo inteligências e, quem sabe, produzindo patentes.

Como já mencionado, Santos e região têm ampla rede de instituições de ensino superior e escolas técnicas, que podem fornecer profissionais aptos a superar os desafios propostos e impostos; e a Fundação Parque Tecnológico de Santos (FPTS), com potencial para fomentar e acelerar startups, gerar conexões e negócios.

Eventuais argumentações de que uma ZPE prejudicaria a indústria paulista e nacional não fazem sentido, posto que a produção destinada ao mercado interno estaria sujeita à regra geral, ou seja, ao mesmo regime tributário existente. Pelo contrário, um “cluster” de robótica e automação seria favorável à modernização e à inovação da indústria brasileira. Ambos ganhariam escala interna e externa, pela redução de custos de produção, incremento de tecnologia e da competitividade do País, no âmbito de exportações.

Quem sabe assim, poderemos evoluir da exportação de grãos, minerais, hidrogênio verde e afins, sempre commodities de baixo valor agregado, que atendem a interesses internacionais, para alcançarmos a condição de desenvolvimento socioeconômico e autodeterminação similares ao das potências mundiais.

Santos como “cluster” de robótica e automação, produzindo para os mercados interno e externo numa ZPE, parte na área urbana, parte na área continental! Ideia que pode beneficiar outras cidades da região.

É importante salientar que essas considerações são pessoais, como engenheiro e pesquisador, com alguns “quilômetros rodados” e um pouco de resiliência e obstinação.

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