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Hudson Carvalho

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Meritocracia e o fim das carreiras como as conhecemos

Fazendo uma reflexão mais profunda nesse ponto específico, tratar como expoentes apenas aqueles que geram resultados a qualquer custo é um dos maiores enganos que se pode cometer nesse tipo de implantação, por ser um elemento altamente desagregador do trabalho em equipe. Os que se sentem preteridos convivem muito mal com isso e começam a considerar rapidamente a possibilidade de migrarem para outra empresa

 

“Duas alavancas movem o homem: interesse e medo” — Napoleão Bonaparte

 

Gosto muito de piadas e histórias curtinhas. Principalmente se expressam a natureza humana. Elas inspiram e são ótimas para serem usadas em palestras e treinamentos, pelo poder que tem de fixar conceitos.

Uma das que gosto particularmente é mais ou menos assim: Dois amigos estão caminhando pela floresta quando encontram um leão enorme, com ar de faminto. Um deles vagarosamente se abaixa, retira da mochila um par de tênis para corrida e começa a calçá-los. O outro lhe diz: Você acha que conseguirá correr mais do que o leão? E o primeiro responde: Eu não preciso correr mais do que o leão. Preciso correr mais do que você.

Eis um dos grandes dilemas da Gestão de Pessoas em nosso tempo: como implantar de forma eficaz e eficiente uma política de meritocracia que se traduza em justiça nas promoções e aumentos salariais, coloque as pessoas certas nos lugares certos e, mais importante do que tudo, passe para cada membro da organização o nível correto de motivação para permanecer na empresa e desejar crescer continuamente na carreira.

Se nosso plano de implantação considerar apenas o resultado final como o “mérito” necessário para crescer profissionalmente, corremos o sério risco de dar oportunidades apenas àqueles que calçam primeiro seu par de tênis, sem importar-se com tudo mais à sua volta. Fazendo uma reflexão mais profunda nesse ponto específico, tratar como expoentes apenas aqueles que geram resultados a qualquer custo é um dos maiores enganos que se pode cometer nesse tipo de implantação, por ser um elemento altamente desagregador do trabalho em equipe. Os que se sentem preteridos convivem muito mal com isso e começam a considerar rapidamente a possibilidade de migrarem para outra empresa. E, muitas vezes, de imediato, apresentam queda de produtividade.

Quem está à frente da implantação desses programas, hoje em dia, precisa ter em mente que a maioria dos postos de trabalho é ocupada por uma geração de profissionais que tem pressa. Além disso, tem um sentido muito diferente do que é vestir a camisa da empresa em comparação com os antigos. Se não estão satisfeitos em determinado local ou emprego, mudam simplesmente.

Falar em crescimento gradativo, de uma carreira que passa por vários estágios de aprendizado, estudo e de experiência, é algo que muitos jovens profissionais não aceitam. Dizer a um deles que são necessários de sete a dez anos de caminhada para ganhar senioridade suficiente para tornar-se um gestor, é algo difícil de fazê-los acreditar.

Então eles estão errados? Não e sim.

Não, porque a forma de criar e fazer funcionar os negócios mudou radicalmente. As antigas estruturas verticais que víamos nas indústrias, por exemplo, têm hoje um papel muito menor, numa economia dominada por big techs que possuem profissionais espalhados por todo o mundo, trabalhando remotamente, e start-up’s que nascem e crescem com velocidade vertiginosa, oferecendo produtos e serviços nos quais não se usou uma única máquina para produzir. A logística de grande parte desses bens não carece de modais físicos para transporte. Saem das mãos de quem produz para as de quem consome, através da Internet. Ora, se tudo é tão rápido, por que não as carreiras?

Sim, porque as últimas gerações, apesar de estarem imersas num mundo tecnológico no qual os profissionais mais velhos não chegaram a sequer pensar, apresentam uma certa ingenuidade sobre o valor que seu trabalho agrega de verdade aos resultados dos negócios. E aí mora parte do perigo. Possuir domínio fácil do uso de determinada tecnologia não garante possuir o desenvolvimento emocional na mesma proporção. É necessário possuir hard skills, mas também soft skills.

Por isso comecei esse texto citando essa frase de Napoleão: os planos de cargos e salários, para terem sucesso, devem levar em conta o que efetivamente interessa aos profissionais, que cada vez menos inclui apenas remuneração, benefícios ou a possibilidade de tornar-se um gestor.

A ideia de uma carreira linear, onde alguém começa sua trajetória na organização como assistente e termina como diretor, tem dias contados. A gestão das carreiras é algo muito mais complexo e fluido. Quer mais? Inclui fatores que não estão sob controle das áreas de Recursos Humanos ou dos líderes do negócio.

Os antigos critérios de acesso, aqueles fatores que garantem que alguém possui todos os requisitos para subir ao próximo cargo, incluirão um número muito maior de habilidades emocionais que a empresa precisará prover por sua conta para criar condições de retenção e atração de pessoal. Não há receita pronta. Cada empresa terá seu próprio mapeamento de cargos, suas próprias soluções e saber que é muito provável que o “mapa” mude muitas vezes.

As avaliações de desempenho deverão ser muito mais frequentes, simplificadas e abertas o suficiente para mostrar de forma clara e honesta onde cada um está acertando e errando.

Interessante que, para um problema tão novo, há uma ferramenta antiga, importante, que continuará direcionando soluções: o bom e velho feedback. Afinal, nada como uma boa conversa para resolver os problemas, não?

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