Não se engane: há o suficiente para todos
A abundância tornou-me pobre
Ovídio, poeta romano (43 a.C – 17 d.C)
Uma das piores crenças que povoam o imaginário da humanidade, se não for a pior, é o Princípio da Escassez: “Não tem para todo mundo” é o lema.
Atendendo a esse chamado, consumimos por impulso, sem avaliar a real necessidade de utilizarmos o produto ou serviço oferecido. Quantas vezes você já ouviu: “oferta por tempo limitado”, ou “enquanto durarem os estoques”. E você, … compra. No débito, no cartão, ou no PIX.
Se o impacto desse princípio fosse restrito apenas ao consumo em si, seria tolerável. O problema é que ele se espalha para outras dimensões mais complexas, trazendo à tona as mais graves condições que envolvem o ser humano que vive em nosso tempo.
Quero começar a desmistificar essa história fazendo uma simples brincadeira de números com você.
A superfície do planeta Terra (só de terra mesmo, descontados os oceanos), é de 150 milhões de quilômetros quadrados. Se considerarmos que somos 8 bilhões de habitantes, teríamos um pouco mais de 53 pessoas vivendo em cada quilômetro quadrado. Meus amigos, cabem 143 Campos de Futebol em um quilômetro quadrado. É pouca gente para muita área. Alguns dirão que em muitos lugares é impossível plantar, criar animais ou construir. É verdade, mas ainda assim, há espaço de sobra.
Falamos de um lugar para morar? Vamos falar de comida? Entre no Google e faça a seguinte pergunta: quantas toneladas de alimentos são produzidas todos os anos?
A resposta será: 5.200 bilhões! São cerca de 650 toneladas por habitante. Muito, não? Então, há o que comer. É só uma questão de distribuição, algo que nós, que trabalhamos com Logística, portos e Transporte, conhecemos muito bem.
Incluindo essas duas observações na Pirâmide de Maslow, aquela que descreve a hierarquia das necessidades humanas, a base está atendida: Necessidades Fisiológicas (comer) e de Segurança (um teto sobre a cabeça).
O dilema, porém, não está na base da pirâmide. Está na penúltima, chamada Estima, que trata do reconhecimento pessoal, status e autoestima, do que desejamos possuir. Focamos o reconhecimento pessoal e o status no “ter” e não no “ser”.
Desculpe-me o trocadilho, mas o “ter” não tem limites. Focados em possuir sempre mais, na tentativa de aumentar nosso status, partimos em busca de um objetivo que se move continuamente “ao infinito, e além”. Daí a autoestima fica baixa, gerando ansiedade que facilmente se transforma em depressão, o grande mal que aflige a sociedade e as empresas da atualidade.
Se não fosse assim, os consultórios dos terapeutas não estariam cheios, os “coaches” e mentores não teriam metade da “importância” que tem e saúde emocional (para não dizer, mental) não seria a maior preocupação das áreas de Recursos Humanos que conheço.
Você pode estar pensando: “Não é fácil fazer as entregas que exigem de nós hoje em dia, e os empregos não estão tão fáceis assim”.
De novo, esse tipo de observação parte do Princípio da Escassez, num universo de abundância. Participo de uma dezena de grupos de WhatsApp que anunciam vagas de todos os tipos: de faxineiro a diretor. Não consigo contar a quantidade de oportunidades de trabalho oferecidas todos os dias. E há centenas de grupos aos quais não tenho acesso.
Se há algum tipo de escassez por aqui, é de qualificação. Nos (poucos) processos de seleção que cuidamos (não é nosso negócio principal. Só fazemos quando o cliente pede que busquemos os profissionais certos para ocupar posições nos projetos que temos em andamento com eles), menos de 5% dos candidatos atendem ao perfil técnico ou comportamental necessário. Escassez num terreno de abundância. Há uma enormidade de treinamentos, cursos, materiais de qualidade, disponíveis por um baixíssimo custo, ou até grátis em qualquer rede social que você acessar. Mas é necessário “abundância de vontade” para acessá-los, processá-los e fazê-los trabalhar em nosso favor.
Desenvolver-se na direção certa não é tarefa fácil. Recebo muitos pedidos do tipo “me indique para aquela vaga” e poucos, quase nenhum, dizendo “me ajude a desenvolver minhas competências”.
Não se equivoque: praticar a disciplina e pedir ajuda são atos que só os vitoriosos fazem. Nesse mercado de trabalho onde todos atuamos, há poucas certezas, mas uma delas é a necessidade imperiosa de usar disciplina e esforço próprio de forma abundante, sem economia.
Como dizem, “parta para cima”! A carreira e a vida são suas, para cuidar e crescer.