O cacau e o Litoral Sul baiano
De repente, um sopro de euforia, otimismo e esperança varreu a zona cacaueira baiana, com a multiplicação do preço da arroba de cacau, após três anos consecutivos de déficit na produção mundial, uma decorrência da crise nas plantações na Costa do Marfim e em Gana, na África Ocidental, os dois maiores produtores mundiais. Hora dos produtores baianos quitarem dívidas, plantarem mais e incorporarem tecnologia, para fazer com que o cacau volte a brilhar na sua tradicional região produtora.
Em relação ao cacau, sua principal lavoura, esta é a boa notícia para o Litoral Sul baiano, nova denominação que recebeu a antiga “região cacaueira”. A má notícia é que “áreas atípicas” no cerrado estão tomando seu lugar, com o desenvolvimento de novas tecnologias e a seleção de mudas que resistem à exposição solar, com a plantação do cacau em sistemas de irrigação.
Preocupadas com a disponibilidade da matéria prima, são as próprias grandes empresas agroindustriais e comercializadoras do cacau que estão provendo o desenvolvimento dessas novas áreas de produção. Mesmo empresas de chocolate, que nasceram a partir do cacau premium aqui produzido, começam a buscar produtores fora do Sul da Bahia. Por exemplo, a Dengo, que trabalhava exclusivamente com produtores da região, vai fazer uma segunda fábrica, também em São Paulo, e vai diversificar as suas fontes de fornecimento da matéria prima. Neste sentido, a Ong Arapyau promoveu, recentemente, a visita de produtores paraenses, que vieram conhecer, para replicar, a experiência da região.
O Brasil produz atualmente menos de 5% da oferta global de cacau e tornou-se importador líquido. Mas a Ceplac (Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira, órgão de pesquisa vinculado ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento) espera que, até 2030, dobre para 440.000 t/ano a produção nacional, passando o País a ocupar a terceira posição de maior produtor global.
Os cacauicultores baianos precisam aproveitar ao máximo a oportunidade presente, visando assegurar a sua fatia de mercado, mas a região, nem por isto, pode cometer o erro de colocar, outra vez, “todos os ovos em uma cesta só”.
É preciso diversificar a economia regional, agregando outros vetores de expansão. O aglomerado urbano Ilhéus-Itabuna forma a terceira maior centralidade do interior da Bahia, superado apenas por Feira de Santana e Vitória da Conquista, embora Ilhéus e Itabuna – que é o centro regional de comércio e serviços – tenham sofrido redução populacional ao longo do último período intercensitário, um reflexo da perda do dinamismo regional.
É grande o cardápio de projetos e iniciativas que, implementados, darão novo vigor à antiga capitania de Ilhéus. A construção da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol) se destaca como elemento fundamental nessa nova configuração espacial do desenvolvimento. A conexão da Fiol com a Ferrovia de Integração do Centro-Oeste (Fico), dando origem a um importante corredor centro-leste, permite trazer para Ilhéus os grãos do Mato Grosso, além da produção do Oeste baiano e do Matopiba.
A expedição, pelo Governo Federal, da ordem de serviço para continuidade das obras da Fiol II aumenta, ainda mais, a responsabilidade da concessionária Bamin pelo cumprimento do prazo de conclusão da Fiol I e pela implantação do Porto Sul.
Integrado à ferrovia, o Porto Sul terá capacidade para movimentação anual de 40 milhões de toneladas de minério de ferro e 20 milhões de toneladas de grãos, constituindo-se em uma grande alavanca para a região. A dragagem e a modernização do porto da Codeba reforçarão a economia local.
Abrem-se perspectivas novas para a industrialização. E a zona de processamento de exportações (ZPE) para aí autorizada desde que o modelo foi instituído, encontra, nesse novo contexto econômico, a oportunidade de, finalmente, sair do papel.
De há muito, Ilhéus necessita de um novo aeroporto para fortalecer sua função regional. Seu deslocamento para outra área, por sua vez, permitirá o desenvolvimento de um projeto urbano-imobiliário no bairro do Pontal que, bem concebido, reconfigurará toda esta área da cidade.
O novo aeroporto, moderno e com maior capacidade, permitirá a Ilhéus apostar com mais firmeza no turismo, não apenas de sol e praia, podendo tirar maior partido da cultura grapiúna, hoje já aproveitado pelo turismo rural, oferecido nas antigas fazendas de cacau. Depois de ter feito sucesso na literatura, no cinema e na TV, por que não Gabriela – a criação imortal do imortal Jorge Amado – tornar-se parque temático?
Hotéis e serviços precisarão ser desenvolvidos para atender ao turismo e às atividades decorrentes desse novo contexto econômico. O centro de convenções, requalificado, deve ser complementado com pavilhão de feiras e exposições, além de hotel.
A estruturação do eixo viário Ilhéus-Conquista em pista dupla, dotado de fibra ótica e gasoduto – articulando o segundo e o terceiro maiores centros urbanos do interior baiano – configurará um novo eixo de desenvolvimento, desconcentrando a economia baiana, contribuindo para sua diversificação e adensamento, para expandir as oportunidades de trabalho e renda da população. Conquista teve um crescimento populacional de 20,8% no último período intercensitário.
Este conjunto de elementos, aglutinados pela reativação da mística do cacau, permite agora que o aglomerado Ilhéus-Itabuna possa recuperar a relevância que sempre teve no cenário estadual baiano.
Waldeck Ornélas é especialista em planejamento urbano-regional. Autor de Cidades e Municípios: gestão e planejamento.