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Luiz Dias Guimarães

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O sentido do trabalho

Poucas espécies vivem para trabalhar. Que me recorde, só os humanos e alguns insetos trabalham tanto. Mas nem sempre fomos assim. Viemos ao mundo para viver. E nos alimentar. Aí os homens saíam à caça. As formigas não, como os cupins e as abelhas, que vivem para trabalhar para a rainha. O trabalho dignifica e enobrece sim, porque consagra o esforço de sustentar a família. E é maior quando se realiza um fazer que dê sentido especial à vida.

Mas não é preciso exagerar.  Nem repetir o vaticínio do intrépido piloto Saint-Exupèry que, pouco antes de morrer em acidente aéreo, disse: “Morre-se por aquilo que faz viver”. 

Sonhar é fundamental sim! Ouvi uma vez um intelectual de esquerda fazer um mea culpa, dizendo que o comunismo errou ao não considerar que somos seres que precisamos sonhar. É verdade, mas será preciso consumir tanto para darmos sentido à vida?

Há, agora, um lampejo de luz. Quem sabe começamos a equilibrar as coisas. Por milênios, trabalhamos muito. Antes pela sobrevivência no campo, depois com a revolução industrial. Mas houve um momento em que deixamos de trabalhar para sobreviver e passamos a trabalhar para pagar as contas dos nossos sonhos. A dita sociedade de consumo é, na verdade, a sociedade do trabalho para consumir o que desejamos sem precisar.

Este século trouxe muitas novidades e, talvez, a maior delas seja de fato a Inteligência Artificial, que poderá em breve nos poupar das tarefas que, pela repetição, podemos chamar de certa forma de ‘escravistas’. Tudo que se faz repetidamente pode ficar a cargo dos algoritmos. Ao menos até o dia em que mesmo as tarefas inovadoras forem dominadas por robôs independentes.

Mas não é só isso. A pandemia nos expôs. As empresas descobriram que muitos preenchiam as horas no trabalho sem produzir o equivalente. O home office deu brecha a entendermos que o importante é o que produzimos, não quanto tempo ficamos sentados em uma cadeira, o que acaba sendo um castigo.

Começou a soberania da produtividade sobre a burocracia do tempo e do espaço. Em muitos casos, não é preciso estar presente, desde que façamos aquilo que esperam de nós. E como sempre houve a latência do nomadismo, que alimentava o turismo de lazer, aprendemos também que, em muitos casos, pode-se ser um nômade digital.

Nem tudo, porém, é assim. Há inúmeras situações em que a presença é indispensável, ao menos por enquanto. Então caímos na questão da carga horária. Há cinqüenta anos, o mundo estabeleceu a semana de cinco dias de trabalho, um grande avanço. Agora o bom-senso pede mais.

Alastra-se pelos continentes a proposta da semana de quatro dias. Sim, até existe uma instituição sem fins lucrativos disseminando a ideia, a 4 Days Week. Os países de economia mais avançada já estão pondo os pés nesse novo conceito. Agora, o Brasil também. Em setembro, começará a experiência em empresas brasileiras, que vão testar a prática de se trabalhar só de segunda a quinta. As primeiras tentativas mundo afora demonstraram que a produtividade, se não aumentou, manteve-se com um dia a menos. Com a vantagem de que os funcionários se tornaram mais felizes. E de quebra, as empresas puderam economizar um pouco com transporte, alimentação, energia…

Tudo indica que este século de tantas novidades vai, em breve, fazer uma revolução no sistema de trabalho. Aí poderemos retroagir um pouco. Às vezes, retroceder não é involuir, ao contrário. E então começaremos a trabalhar para viver e não viver para trabalhar, de preferência no que nos dá sentido. 

O prazer indelével da vida está no sonho de ser feliz. Mas ninguém disse que felicidade é sinônimo de Rolex ou Louis Vuitton.

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TAGS consumir insetos os humanos sociedade

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