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Opinião

Editorial

Hudson Carvalho

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Articulista

Ponha-se no seu lugar!? Não vamos construir juntos o “nosso” lugar

“Quando não sabemos nos colocar no lugar do outro, a vida nos coloca lá para aprendermos na prática.”

Uma verdade, de autor desconhecido

Meu sogro, Jahury Brandão, tem oitenta e seis anos. Ou, como ele diz, “indo para oitenta e sete”. Sempre se comportou em relação a mim como um pai, somando-se ao que tive. Além de parentes, somos vizinhos, por isso, nos vemos bastante. Mesmo nas semanas mais corridas, temos uma rotina, aos sábados pela manhã, que não falha: uma passada na lotérica para um joguinho que ele adora, o mercado, para repor o que falta na dispensa, e às vezes um corte de cabelo e barba.

É justamente nesse barbearia que frequentamos há anos, onde ele se supera. Não há quem não o conheça. Os barbeiros param o que estão fazendo para abraçá-lo. Os clientes, que até então não o conheciam, falam com ele como se fossem velhos amigos. É o Rei da Simpatia e vai além. Em nossas conversas frequentes, sei que ele é bom em criar empatia também, essa capacidade de se colocar no lugar do outro.

Aliás, pesquisando para a produção desse texto, buscando as razões, os resultados e as melhores formas de nos colocarmos no lugar do outro, encontrei, quase exclusivamente, referências à empatia, como forma de fazê-lo.

Reconheço o quanto ela é importante, que é um bom começo, mas me parece pouco dizer que uma única competência seja capaz, verdadeiramente, de nos colocarmos no lugar do outro. A construção e manutenção dos relacionamentos é algo muito complexo, o mundo e as pessoas são muito complexos para uma simplificação desse tamanho, ainda mais num momento em que as posições da maioria das pessoas estão polarizadas. Parece que vivemos um imenso Fla-Flu, onde só se pode torcer para um time ou para o outro. Ou temos a mesma visão de mundo ou somos inimigos mortais.

Na sociedade em geral, isso é péssimo. No ambiente corporativo, onde os resultados dependem de quanto somos capazes de trabalhar em conjunto, a falta de capacidade de colocar-se no lugar do outro pode ser devastadora.

Então vamos lá, pensar além da tão importante empatia. A minha experiência pessoal mostra que o primeiro passo é derrubarmos internamente a tendência a uma certa arrogância que temos de achar que estamos sempre certos. Ou que, na remota possibilidade de não estarmos, um especialista – de preferência um que concorde conosco – possa ajudar. Há um experimento muito interessante que mostra como essa linha de raciocínio é pouco eficaz. Uma pesquisadora norte-americana reuniu um grupo de pessoas e, com elas, simulou um programa de auditório, aqueles de perguntas e respostas. Os participantes poderiam responder às perguntas sobre temas variados, usando seus próprios conhecimentos, pedir auxílio “aos universitários” ou à plateia, composta de pessoas de qualificações e experiências variadas.

O maior nível de acerto nas respostas da plateia sobre os especialistas e desses sobre a opinião individual aconteceu na grande maioria das vezes, dando razão ao dito popular que diz que duas cabeças pensam melhor do que uma. Abrir-se ao que pensa o outro, principalmente se for diferente de nossa opinião, abre um leque de vantagens, inclusive a de agregar o pensamento fora da caixa, além do divergente.

O desafio, então, não está em compreender que é um bom caminho. Está em desprender-se e ter coragem de fazer, simplesmente. Temos que vencer a síndrome de Gabriela. Lembra da música? “Eu nasci assim, eu cresci assim, vou ser sempre assim”. Não funciona.

Entendo que boa parte da resistência em colocar-se no lugar do outro vem do receio de assumir integralmente a posição do outro. Não é disso que estamos falando. O objetivo é ouvir o contraditório para melhorar a nossa própria interpretação dos fatos e dados que dispomos e, à partir daí, formar uma terceira opinião, melhor que as duas anteriores. Um pouco de conversa e todos crescemos.

Perceba que o binômio falar-ouvir, base dessa dinâmica e que será acionado, muitas e muitas vezes até obtermos resultados, não pode confundir comportamentos: o fato de um lado ser educado o suficiente para ouvir, não pode ser confundido com a possibilidade de ser enganado. É um jogo de cartas abertas. Quase não há mais ingênuos no mundo e quando existem, aprendem rápido que estão sendo enganados. O segredo aqui é entender não apenas o que o outro lado pretende, mas porque pretende.

No ambiente organizacional, as empresas têm um papel fundamental a exercer nesse cenário. Não podem cometer dois pecados mortais: o primeiro é deixar espalhar a cultura do medo. Ouvir o outro e, a partir desse ponto, criar novas e melhores soluções, é um processo de aprendizado que começa com falhas e vai melhorando na medida em que se aprimora. Se punirmos as naturais ocorrências negativas do início, a ideia tende a morrer. O segundo é gerenciar pelo conflito. Em outras palavras, tentar tirar o melhor das pessoas estimulando a competição não sadia entre os membros das equipes. Sinalizar para a organização que alguém que derrota ideias dos demais é bem visto também encerra o processo. Por reação, os preteridos agirão da mesma forma e o nível de conflito subirá, tomando o lugar das soluções construídas em conjunto. Ou saímos todos melhores do que entramos ou não funciona.

Por fim, repasso o ponto fundamental para despertar em cada um de nós essa capacidade tão importante que é colocar-se no lugar do outro: vencer a nossa própria natureza, que tende a concluir que nossa visão é única e melhor que as demais.

Usarei uma história conhecida: Um escorpião estava à beira do rio pretendendo atravessar para a outra margem. Pediu então ao sapo que o ajudasse. Esse, de imediato, negou, afirmando saber que o seu “carona” o mataria no meio do caminho. Ante a insistência do escorpião, que afirmava saber que não poderia fazer nada, sob pena de ambos morrerem afogados, concordou em transportar o “amigo”. No meio do caminho, foi surpreendido por uma ferroada mortal. Só teve tempo de dizer: Você prometeu que, … e de ouvir a resposta do escorpião: Pois é, eu disse, mas essa é a minha natureza. E assim, afogaram-se.

Enquanto formos “escorpiões”, nada disso funcionará.

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TAGS corporação cultura empatia equipe gestão

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