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Maria Cristina Gontijo

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Reflexões sobre a jornada da sustentabilidade no setor portuário brasileiro e a esperança dos fundos verdes

O ESG, sigla que remete às boas práticas de governança social e ambiental, passou a ser temática obrigatória a ser discutida nos fóruns de infraestrutura do setor portuário e de navegação. Em paralelo a isso, soma-se o fato de que o Brasil tomou seu lugar como protagonista da segurança alimentar mundial, sendo um dos maiores exportadores de proteína animal e vegetal do planeta. Somos de fato, o “país do agronegócio”.

E neste ponto, o investimento em pesquisa, somado ao fomento da produção, fez a diferença, tornando o agronegócio extremamente competitivo em relação ao setor de infraestrutura brasileiro, que demorou a ter a mesma atenção por parte das políticas públicas de desenvolvimento econômico, e que hoje precisa recuperar o tempo perdido. É importante lembrar que Evaristo de Miranda, engenheiro agrônomo de formação, com Mestrado e Doutorado em Ecologia, foi um dos grandes idealizadores da sustentabilidade no agronegócio, e um dos responsáveis pela Embrapa ser a referência mundial que é hoje.

E sim, se dentro da “porteira” passamos a ser referência, inclusive enfrentando desafios, como a moratória da soja, e prestes a enfrentar novos parâmetros e restrições que entrarão em vigor em 2025, pela União Europeia, a mesma situação não se deu de forma tão incisiva em relação à infraestrutura e à indissociável logística, necessárias tanto para atender ao setor produtivo (exportações e importações), como para atender as demandas da economia interna e da população que reside em um país de dimensões continentais como o Brasil. 

Outra curiosidade é que entre 2016 e 2018, no Brasil pouco se falava em transição energética e redução de emissões de gases de efeito estufa no transporte marítimo. Falar de quantificação, então, poderia ser considerado uma piada. Hoje as certificações GHG Protocol são uma realidade. 

Mas por que a preocupação, por exemplo, com as questões relacionadas à poluição atmosférica na navegação e nos portos não era tão significativa? A justificativa é que os estudos da época mostravam, naquele momento pré-pandemia de COVID-19, que a indústria da navegação, além de ser responsável pelo consumo de aproximadamente 12% da matriz energética mundial (2019), emitia em média 1 (um) bilhão de toneladas de dióxido de carbono por ano, sendo responsável por aproximadamente 3% das emissões mundiais. Então, estava tudo certo? Não!

O fato é que o crescimento elevado da frota naval e o aumento do comércio mundial tendiam a elevar as emissões para 1,7 bilhões de toneladas anuais até 2050, se nenhuma medida fosse tomada naquele momento (HARRIS e BAKER, apud GONTIJO, 2021). Assim sendo, o cenário mudou, e a busca pela sustentabilidade teve início também no transporte marítimo e no setor portuário brasileiro. Somou-se a essa equação, a pandemia de COVID-19, novas guerras no contexto geopolítico, discussões acaloradas no âmbito da indústria da navegação, os movimentos de verticalização e o próprio movimento ESG dentro do mercado financeiro mundial. 

Como exemplo desta transformação, o setor presencia o protagonismo do Ministério dos Portos e Aeroportos – MPOR, que recentemente criou uma Diretoria de Sustentabilidade; e a ação da Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ junto com a Marinha do Brasil, assumindo obrigações de fiscalizar e implementar instrumentos de sustentabilidade no transporte marítimo e nos portos brasileiros. 

Essa nova realidade não está restrita ao setor de navegação de longo curso, também abrangendo a cabotagem e navegação interior. Além disso, o MPOR recentemente traçou objetivos específicos para o setor portuário, com base no Plano Clima, consequência direta não só dos ODS – Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, mas também da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima de 1997 (UNFCCC). Esses objetivos específicos se referem a temas como: selos de sustentabilidade e prêmios ESG, planejamentos e projetos nas futuras concessões, BR do Mar, ampliação do Fundo da Marinha Mercante (FMM), combustível sustentável da aviação – SAF, e possibilidade do uso do hidrogênio verde (net zero emissions), entre outros.

Portanto, o Brasil é cobrado por meio de acordos internacionais e contratos privados, no que se refere aos produtos que exporta, e tem atendido aos parâmetros de sustentabilidade impostos. Então, quando vamos entender e internalizar que os parâmetros de sustentabilidade recaem sobre toda a cadeia logística? Por que ainda estamos discutindo os conceitos de logística ecoeficiente e portos verdes como algo inatingível?

Dessa reflexão surge a questão: como fomentar e desenvolver infraestrutura e negócios obedecendo aos parâmetros de sustentabilidade no Brasil? Essa análise deve considerar não só navios ecoeficientes, mas também instalações portuárias ecoeficientes para receber e operar essas embarcações, o que depende de cada caso. O certo é que, com o surgimento dos chamados “fundos verdes”, o movimento ESG ganhou mais força.  Exemplo são os Princípios de Poseidon, uma framework de alinhamento climático desenvolvida pelos principais bancos marítimos, para estabelecer uma estrutura global comum para avaliar quantitativamente e revelar se as carteiras de empréstimos das instituições financeiras estão alinhadas com os objetivos climáticos adotados (2020).

Por outro lado, Poder Público brasileiro também precisa, com ética e independência, regular e ofertar segurança jurídica tanto ao investidor, quanto ao executor de projetos de infraestrutura “verde”. Considerando a potencial obtenção de greenbonds a partir de fundos públicos ou privados, nacionais ou internacionais, se impõe o desafio de buscar consultorias especializadas, e de amadurecer e tornar mais objetivas e rapidamente implementáveis as discussões e instrumentos normativos que vão proporcionar a necessária segurança, sob pena de falharmos (a exemplo do caso dos créditos de carbono), e termos que mais uma vez tentar recuperar o prejuízo. 

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