No período mais grave das enchentes, entre abril e maio, o Rio Grande do Sul chegou a ter 75 trechos de 44 rodovias com bloqueios totais ou parciais, entre estradas, pontes e balsas (Foto: Divulgação/Dnit)
Rodovias
Setor privado vê com bons olhos nova portaria para concessões
Grupos associados do MoveInfra já estão desenvolvendo planos de resiliência para suas infraestruturas
Natalia Marcassa, a CEO do MoveInfra, movimento que reúne os seis principais grupos de infraestrutura do país (Ecorodovias, Rumo, Santos Brasil, Ultracargo, Hidrovias do Brasil e CCR) disse que o setor privado considerou “uma importante medida” a portaria publicada pelo Ministério dos Transportes, no dia 1º de julho, que exige sustentabilidade em concessões rodoviárias.
A portaria (nº 622/2024) estabelece o direcionamento de, no mínimo, 1% da receita bruta dos contratos de concessões rodoviárias federais ao desenvolvimento de infraestrutura resiliente, ou seja, uma infraestrutura capaz de voltar ao seu estado original após uma situação de estresse – como o causado por desastres naturais.
Modificações em, por exemplo, pavimentos utilizados em rodovias que possuam melhor capacidade de drenagem; realocação ou redesenho de estradas críticas localizadas em zonas de inundação; realização de plantio de vegetação ao longo das vias para diminuir a exposição das rodovias à inundação, são algumas das ações que podem trazer durabilidade às infraestruturas logísticas brasileiras, que assim como em outros lugares do mundo, vêm sofrendo com o impacto dos fenômenos climáticos associados ao aquecimento global.
“Nós já sabemos que os eventos climáticos estão avançando em severidade e também em frequência. Então, precisaremos ter um olhar para essa infraestrutura resiliente. No ano passado, o desastre que atingiu o Litoral Norte (SP) afetou também a infraestrutura de uma das nossas associadas. O mesmo ocorreu neste ano, no Rio Grande do Sul”, citou Natalia.
As chuvas citadas por Marcassa que castigaram o litoral norte de São Paulo em 2023 foram as maiores registradas na história do país, com 638 mm em 24 horas, de acordo com os dados do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden). À época, mais de 20 pontos das rodovias que dão acesso à região ficaram bloqueados, sendo a Rio-Santos a mais prejudicada.
Neste ano, foi o Rio Grande do Sul que enfrentou a força da natureza. Após chuvas ininterruptas entre abril e maio, o estado contabilizou 180 mortes, 470 cidades alagadas e mais de 2,281 milhões de pessoas afetadas, segundo dados mais recentes do boletim da Defesa Civil. No período mais grave, o Rio Grande do Sul chegou a ter 75 trechos de 44 rodovias com bloqueios totais ou parciais, entre estradas, pontes e balsas.
Para reparar tantas rodovias destruídas, o governador do Estado, Eduardo Leite, estimou pelo menos R$ 3 bilhões. E para os próximos anos, R$ 10 bilhões devem ser direcionados para realizar adaptações nesses ativos frente às mudanças climáticas em curso.
Neste novo cenário, Natalia garantiu que as empresas associadas ao MoveInfra também já estão desenvolvendo os planos de resiliência de suas infraestruturas. Além de mapear os locais mais propícios aos impactos, os dados indicarão onde e como fazer os investimentos necessários.
Além da infraestrutura, Marcassa lembra que as companhias precisam adotar medidas para descarbonizar suas operações. “Está em discussão agora o Plano Clima, pelo Ministério do Meio Ambiente, e estamos participando deste debate. Ele deve trazer um limite de emissões (de GEE) para cada setor, então é preciso sim ter um olhar do setor público para avançarmos com essas questões”, ressaltou.
Segundo o Ministério do Meio Ambiente, o Plano Clima será construído “com base sólida na ciência e em sintonia com o conhecimento obtido na escuta de diferentes setores da sociedade”. Ele será composto por 15 planos setoriais que trarão metas, formas de implementação e meios de financiamento necessários.
Nova portaria exige estudos de vulnerabilidade em concessões rodoviárias vigentes
A nova portaria publicada pelo Ministério dos Transportes, que exige ações sustentáveis nas concessões rodoviárias, determina ainda que, para os contratos vigentes, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) deve, em conjunto com as concessionárias, realizar estudos para identificar áreas vulneráveis e definir ações necessárias a serem implementadas. Os recursos destinados a ações de adaptação da infraestrutura rodoviária devem ser limitados, preferencialmente, a 1% da receita bruta da concessão. Já os investimentos para mitigação de impactos ambientais devem ser restritos a 1% da Tarifa Básica de Pedágio.
Após a aprovação dos impactos tarifários pelo Ministério dos Transportes, a ANTT promoverá a adequação dos contratos, incluindo novos investimentos que não estavam previstos e que foram identificados como prioritários nos estudos realizados.
Gastos
Em entrevista exclusiva ao BE News publicada em maio, o secretário executivo do Ministério dos Transportes, George Santoro, havia destacado que os gastos públicos com reparos em infraestrutura rodoviária e ferroviária impactada por eventos climáticos não param de crescer. Em 2022, esses custos chegaram a R$ 150 milhões; em 2023, quase R$ 800 milhões foram investidos, e neste ano, antes mesmo da crise que afetou o Rio Grande do Sul, o Ministério já havia desembolsado R$ 600 milhões para obras emergenciais. A previsão é que o Brasil encerre 2024 com um total de R$ 2 bilhões em gastos com reparos na infraestrutura do setor.
“São gastos expressivos e a gente vem trabalhando no Ministério para construir uma agenda de desenvolvimento de infraestruturas mais resilientes”, citou Santoro. Ele ressaltou a necessidade urgente de preparar a infraestrutura do país para resistir aos impactos das mudanças climáticas, que têm se intensificado e se tornado mais frequentes.
Com a portaria, George Santoro estimou que cerca de R$ 300 milhões por ano serão aplicados em infraestruturas resilientes e em medidas mitigadoras, como a transição energética.
“Estamos deixando no programa a liberdade para a concessionária tomar a decisão, mas estamos induzindo os caminhos através desta portaria”, explicou.
Em nota, a ANTT informou que também está trabalhando em um Plano de Sustentabilidade em concessões rodoviárias e ferroviárias federais – atualmente em fase de audiências públicas. A iniciativa visa integrar critérios socioambientais e de governança corporativa às concessões, buscando o desenvolvimento sustentável do setor de transportes terrestres.