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Vida de Delegada não é fácil

15 de julho de 2023 às 10:49
Ivani Cardoso Enviar e-mail para o Autor
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Situações-limite podem revelar atitudes que sequer imaginamos. Foi assim com Luciana Fuschini Nave, por mais de 20 anos Delegada da Polícia Federal em Santos, que descobriu aos 18 anos a vocação quando ela e o namorado estavam chegando em casa e foram rendidos com arma e sequestrados por um psicopata.

“Ele nos levou para uma casa abandonada no meio do mato, perto do porto. Como eu sou uma pessoa muito emocional, naquele momento eu tive uma reação que não conhecia: frieza para lidar com o estresse e o medo, foi intuitivo. Ao perceber que ele era um sádico, consegui me manter calma e agir. Fui conversando e dei a chance para que meu namorado reagisse. Deu certo e veio a certeza: eu queria combater esse tipo de crime, despertou a vontade de ser policial”.

A chance veio quando prestou o concurso para delegada federal,  em 2002. A classificação excelente permitiu que ficasse em Santos (SP), sua cidade. O exame, ela conta, é bem difícil: “Precisei até aprender a subir em corda num circo”. Antes, de 1993 a 2002, foi servidora pública estadual na Vara do Júri, execuções Criminais e Corregedoria dos Presídios- Santos/SP. 

Chefiou o Núcleo de Imigração e Passaporte da Delegacia de Polícia Federal, foi Coordenadora da Comissão Estadual de Segurança Pública nos Portos, Terminais e Vias Navegáveis de São Paulo (CESPORTOS/SP) e docente na Academia Nacional de Polícia.

Em todos esses anos, Luciana passou por muitas experiências em vários Estados do Brasil, atuando em investigações em inquéritos nas áreas de lavagem de dinheiro, previdenciária, eleitoral, corrupção, sonegação fiscal, aduaneira e tráfico internacional. Participou de interrogatórios de grandes operações como Zelotes e Lava Jato. “Um dia investigamos alguém em um prédio de alto luxo em São Paulo, em outro estamos subindo morro do Rio de Janeiro atrás de traficante internacional”.

Formada pela Faculdade Católica de Direito de Santos, sempre gostou de estudar e fez vários cursos de formação estratégica dentro da Polícia Federal. Recentemente esteve na França, a convite do governo francês, para fazer esse intercâmbio de conhecimento no setor de tráfico internacional de drogas. nessa área. “Somos um país muito visado e o Porto de Santos é uma rota internacional. Na Polícia Federal apreendemos uma média de 20 toneladas de cocaína por ano saindo do nosso porto”, revela.

Entre os casos inusitados que atendeu, lembra de uma operação no Interior do Estado de São Paulo, em uma casa de periferia cercada por muito mato e lama. Sabiam que havia drogas, mas não conseguiram encontrar. Então Luciana resolveu com a equipe procurar no chiqueiro. Resultado: pé na lama, cavaram e acharam.

Atualmente a mídia divulga com muita frequência ações da Polícia Federal no Porto de Santos e Luciana explica que esse aumento se deve à intensificação das normas de segurança com o ISPS-Code, um código internacional de segurança: “Depois do 11 de setembro, os Estados Unidos e os países signatários perceberam a vulnerabilidade, principalmente na área de portos e aeroportos, e criaram esse código internacional. Cada país aplica de uma maneira diferente. Nos Estados Unidos quem coordena é a guarda-costeira; no Brasil é a Polícia Federal”.

O número de mulheres ainda é reduzido na profissão. Ela acredita que está em torno de 13%. Por ter um cargo de mando, diz que só sentiu preconceito de forma subliminar e em algumas esferas. Ter sensibilidade, senso de observação e saber ler as pessoas são características importantes para quem atua na Polícia 

Federal. “Temos treinamento de expressão corporal, microexpressão corporal, técnicas de entrevista, como lidar em um interrogatório. Acho que em toda profissão que lida com pessoas deveria ser obrigatório o curso de Psicologia também”.

Um dos desafios da Polícia Federal é não poder algemar os suspeitos durante uma investigação. Se for o caso, é preciso justificar e o procedimento pode até se anulado. Ela não concorda com isso: “Sempre algemei e sempre justifiquei, nunca se sabe o estado psicológico, há casos de busca em que a pessoa se joga pela janela, há os que resistem e conseguem matar um colega, nessas horas a imobilização é importante”.

Um delegado participa de todas as ações. “Na Polícia Federal, quando você faz operações nos estados, normalmente trazem pessoas de fora para não ter nenhum tipo de vínculo com eventuais suspeitos. Um policial fiscaliza o outro. Só ficamos sabendo a missão em cima da hora, às vezes estamos num voo sem imaginar para onde vamos”, diz.

Aposentada há apenas dois meses, está estranhando a vida mais tranquila. E claro que com toda essa adrenalina, seria impossível ficar em casa. Com a experiência ampla na área de segurança, abriu duas empresas: Fuschini Nave (consultoria e inteligência) e Portus Firmum (consultoria em segurança portuária – ISPS Code), para ajudar as empresas a fazer essa certificação.

“Implementamos também a área de inteligência nas empresas, para mapear as questões de vulnerabilidade até na forma de contratação de funcionários, setor de Tecnologia da Informação e imagem. Ajustamos os GAPs que verificamos na auditoria preliminar. É uma experiência muito rica”, explica.

Por conta da profissão, sempre andou armada e evita se expor e a família em redes sociais. “Você se aposenta, mas não deixa de ser polícia. Sempre tive cuidado. Minhas três filhas têm uma baita admiração pelo meu trabalho, mas nenhuma quis seguir; eu como mãe não recomendaria mesmo, mas como profissional sim, é uma profissão linda”.

Como antes trabalhava de 13 a 14 horas por dia, não dava tempo para o lazer. “Gosto muito de ler (leio três livros ao mesmo tempo), de cinema e música. Meu lugar preferido é olhar Santos lá do alto da Ilha Porchat, em São Vicente. É programa de turista, mas eu ainda me encanto”.

Para Luciana, sagitariana típica, o espírito de justiça aparece bem aflorado. E isso vem desde a infância. “Sou uma pessoa muito franca, aberta e verdadeira, até demais.  É engraçado que eu consegui conciliar essa franqueza com a parte policial, e acabou sendo uma característica boa nos interrogatórios, cria empatia. Em qualquer profissão você pode fazer o bem, ajudar as pessoas e nunca deixar de ser quem é”.

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TAGS Delegada Luciana Fuschini Polícia Federal Vara do Júri