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Cuidado! A catarata precoce pode ser risco de demência
O Brasil tem uma população de 24 milhões entre 50 e 59 anos e nesta faixa etária 1 em cada 4 já tem catarata, incidência bastante superior à estimada pela Organização Mundial da Saúde. A catarata é causa de cegueira evitável e um dos maiores problemas de saúde pública no Brasil. Agora, nova pesquisa publicada pela Nature aponta risco de demência causada pelas alterações visuais que caracterizam a catarata. Entrevistamos o oftalmologista Leôncio Queiroz Neto, do Instituto Penido Burnier de Campinas (SP) que alerta: “Nos consultórios, muitos pacientes adiam a cirurgia. Isso desregula todo o metabolismo e pode provocar outros problemas de saúde, entre eles diabetes, hipertensão arterial, depressão e a insônia, que ameaçam a saúde do cérebro”.
O que é catarata?
Catarata é a opacificação da lente interna do olho, o cristalino. A maior causa da doença é o envelhecimento, que degenera as células. O embaçamento do cristalino dificulta que a luz chegue à retina e ao nervo óptico para ser enviada a um núcleo do cérebro onde se formam as imagens, e é isso que explica a correlação entre catarata e cognição.
Quais os sintomas?
Os sintomas da catarata são: troca de óculos com frequência; perda da visão de contraste e de profundidade; enxergar halos ao redor da luz; fotossensibilidade ou desconforto em locais bastante iluminados; redução da visão noturna e da capacidade de adaptação em locais com diferentes intensidades de iluminação; diminuição da velocidade ao andar e maior propensão a quedas.
Quando é preciso operar?
A cirurgia deve ser feita quando a visão começa atrapalhar as atividades cotidianas, o que varia de uma pessoa para outra. Depende das condições de saúde ocular e física, atividades praticadas e hábitos de cada um.
Quem não deve operar?
Para agendar a cirurgia, todo paciente deve fazer um hemograma completo, exame de urina e eletrocardiograma. Isso porque, a cirurgia é de catarata é contraindicada para quem tem infecção urinária, baixa contagem de plaquetas no sangue, diabetes, hipertensão ou doença cardíaca descontrolada. Nestes pacientes a operação só é agendada quando todos estes parâmetros clínicos estão sob controle para evitar intercorrências durante o procedimento.
A idade é um risco?
Não é. Cada vez é mais comum operar pacientes centenários, por conta do aumento da expectativa de vida. Entretanto, ninguém deve adiar a cirurgia, a menos que os exames clínicos indiquem a necessidade. A catarata madura torna o cristalino mais rígido, expõe os olhos a mais tempo de ultrassom, dificulta o procedimento e tem efeitos colaterais em toda a saúde, inclusive na cerebral, além de predispor ao isolamento e falta de sono.
Quais são os riscos de uma cirurgia não ser bem-sucedida?
A cirurgia é bastante segura e uma das área da Oftalmologia que mais agregou novas tecnologias nos últimos anos. Para se ter ideia, 98% das cirurgias ocorrem sem intercorrências e a maioria dos pacientes se arrependem de não ter operado antes. Embora raro, o oftalmologista afirma que é possível ocorrer o deslocamento da lente intraocular por um trauma, especialmente quando os esportes são praticados sem óculos de proteção após a operação. Trata-se de uma emergência e quanto antes for tratada, melhor é a recuperação.
Por que as pessoas têm tanto medo de fazer a cirurgia?
A maior causa segundo as pesquisas é a falta de informação. Naturalmente, como toda cirurgia a de catarata não está completamente isenta de risco, mas o grau de segurança é bastante alto e não justifica o medo de operar. A visão responde por 85% de nossa integração com o meio ambiente e está diretamente relacionada à nossa independência.
Depois de um tempo é preciso refazer a cirurgia?
A catarata não volta. Uma vez operada, está definitivamente solucionada. Depois de algum tempo da cirurgia muitos pacientes desenvolvem a catarata subcapsular, uma opacificação no saco capsular, local onde fica apoiada a lente intraocular. Para resolver o indicado é a aplicação de laser, procedimento indolor, não requer internação e no mesmo dia é possível retomar as atividades. É importante manter o acompanhamento da saúde ocular após a cirurgia.
Há prevalência entre homens ou mulheres?
Um levantamento realizado em 2022 no Instituto Penido Burnier, mostra que o diagnóstico da catarata foi 18% maior nas mulheres acima de 50 anos do que entre homens da mesma faixa etária. Isso acontece porque na mulher o cristalino tem receptores de estrogênio e desde a menarca as flutuações hormonais expõem o cristalino a maior stress oxidativo.
O que indicou a nova pesquisa?
Realizada no Reino Unido com 9 mil participantes, a pesquisa usou o Teste de Sensibilidade Visual (TSV) que mede a velocidade de processamento visual e o tempo de reação no acompanhamento de imagens em movimento. Após 15 anos, os 500 participantes que incialmente apresentaram baixa sensibilidade visual apresentaram demência, indicando que o TSV pode ser integrado a outros testes cognitivos no rastreio de risco e diagnóstico precoce de doenças degenerativas do cérebro, como o Alzheimer.
A cirurgia de catarata reduz em 30% o risco de Alzheimer?
Esta redução já foi observada no estudo publicado no JAMA, periódico da Academia Americana de Medicina. Com a recuperação da visão, a cirurgia melhora a prática de atividades físicas e sociais e abranda a atrofia do córtex visual, potencial acelerador da neurodegeneração. Não é o primeiro estudo que associa catarata à demência, mas é claro que nem todas as pessoas que têm catarata desenvolvem a doença, que é multifatorial. Além do envelhecimento, a catarata pode ser causada por trauma, diabetes, exposição ao sol sem lentes com proteção ultravioleta, tabagismo, vape (cigarro eletrônico) e pelo uso contínuo de alguns medicamentos, entre eles os corticoides, estatinas e antidepressivos.