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Estilo BE entrevista o advogado e professor Fernando Canhadas

Atualizado em: 13 de julho de 2024 às 2:48
Ivani Cardoso Enviar e-mail para o Autor

advogado e professor Fernando Canhadas

Planejamento Sucessório facilita a vida

 Quem já passou pelo desgaste de brigas familiares por questão de herança sabe o quanto é essencial evitá-las. O Planejamento Sucessório é uma opção excelente e econômica, como explica o advogado e professor Fernando Canhadas, formado pela PUC-SP e sócio do Lima Gonçalves, Jambor, Rotenberg & Silveira Bueno Advogados. Confira a entrevista:

 

Pode explicar como funciona o Planejamento Sucessório?

O Planejamento Sucessório tem a finalidade de antecipar as questões da herança e facilitar a vida dos herdeiros, trazendo mais economia e tranquilidade, além de proteger o patrimônio. Dependendo da situação da família, ele pode trazer o que chamamos de “blindagem patrimonial”, ideal para quem tenha eventuais passivos como por exemplo diretores, administradores ou sócios de empresas que podem gerar dívidas questionáveis que contaminem seu patrimônio.

 

As dívidas passam para os herdeiros?

Não se herda dívida no Brasil. As dívidas serão cobradas até o limite do patrimônio do devedor. Quando a pessoa deixa mais dívida do que o patrimônio, o dinheiro da herança não entra. Às vezes, aparecem dívidas posteriores e que não eram conhecidas, gerando processos.

 

Como funciona o testamento?

O testamento é a manifestação de vontade em que a pessoa estabelece o que deve ser feito com o seu patrimônio após sua morte, sendo que a lei brasileira permite a disposição de apenas 50% desse patrimônio, ou seja, é o que chamamos de herança disponível. É possível doar para quem quiser 50% do seu patrimônio, sem nenhuma condição.

 

E os outros 50%?

A outra parte do patrimônio é a herança necessária, e essa não tem como dispor: 50% vai necessariamente para os herdeiros, o Código Civil de 2002. Não é herdeiro o cônjuge casado no regime da comunhão universal, ele é dono de 50% de tudo, o chamado meeiro. Herdeiro é por exemplo o cônjuge casado em regime de comunhão parcial, junto com os filhos. Se não houver filhos e os ascendentes forem falecidos, só aí a herança passa para a linha colateral de irmãos, tios e sobrinhos.

 

O que é o Pacto Antinupcial?

Pacto Antinupcial  é sempre recomendado e pode seguir o regime da separação total, como se faz obrigatório a partir de 70 anos de idade. Os bens não se comunicam com o cônjuge, mesmo que sejam adquiridos na constância do casamento. Mais recente é o Contrato de Namoro, para dizer expressamente que não se está casando. É uma boa medida até que se decida, e funciona tão bem quanto um pacto antinupcial.

 

O que é holding?

Uma boa opção ao testamento é criar uma Holding Familiar, uma pessoa jurídica que vai fazer a administração dos bens. Para isso basta abrir uma pessoa jurídica com seus filhos, esposa ou marido e colocar os bens da família dentro dessa empresa. Os donos do patrimônio passam a ter as cotas da empresa e os bens pertencerão à pessoa jurídica. Isso é feito na forma de aumento de capital. Transferir esses bens pode ter um custo muito baixo, que é basicamente o da Junta Comercial e a averbação no cartório.

 

É uma doação em vida?

Não é uma doação, se eu fizer pelo valor da minha declaração eu não vou pagar nada. O fisco municipal pode tentar cobrar o Imposto Sobre Transmissão de Bens Imóveis, que pode incidir nessa operação caso os bens sejam destinados à locação ou à venda. Se a holding for fazer dinheiro com os bens, o que pode ser muito lucrativo, tem o ITBI e, nessa transferência, é preciso pagar os 3% (alíquota de São Paulo). Se não envolver dinheiro, é necessário pedir à Prefeitura uma isenção do ITBI, antes de se registrar na Junta.

 

Por que a holding facilita?

Em primeiro lugar vem o lado emocional que é muito sério;  com a holding as brigas são postergadas. A grande parte das brigas familiares acontece por questões bobas. No momento do falecimento, onde a questão do dinheiro aparece, não há muito o que se disputar quando foi feita a holding. Cada herdeiro fica com a parte dele da empresa, mas a divisão vai ser discutida ao longo do tempo, na gestão dos bens, pois a sucessão é praticamente automática.

 

E se quiser vender os imóveis que estão na holding?

Depois que esses imóveis estão na holding, é possível gerir melhor o patrimônio. A pessoa se quiser pode doar a cota para os filhos e aí sim paga-se o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos. No caso da holding, o usufruto traz o direito a voto para as decisões: você pode vender o imóvel, comprar outros, os filhos têm apenas as cotas da holding, mas não têm os direitos sobre a negociação dos bens da empresa. Usufruto garante também a distribuição de 100% dos lucros aos donos do patrimônio.

 

Há outras vantagens?

O planejamento da holding é patrimonial também, e gera uma eficiência fiscal importante. Na pessoa física, você paga 27,5% sobre o aluguel de imóveis. Na pessoa jurídica, sob o regime de lucro presumido, que é o mais usado, o aluguel cai para 11,33 até o limite autorizado, menos da metade. Os dividendos vão todos para o autor da holding. Está para ser aprovada na Reforma Tributária até o ano que vem, a tributação sobre os dividendos. O Brasil ainda é um dos únicos do mundo que não tributa dividendos.

 

Para garantir a segurança, o que é preciso?

Antes de se criar a holding é possível fazer a doação dos bens. Recomendamos o que chamamos de reserva de usufruto para  aproveitar a alíquota menor do ITCMD e doar para os herdeiros apenas a chamada nua propriedade. Assim, você garante: o direito de moradia vitalícia até o falecimento; receber os frutos, como receita da locação, por exemplo. O imóvel doado não pode mais ser vendido. A vantagem adicional relevante é que o ITCMD nesse caso é pago 2/3 agora e o restante com o falecimento, com a garantia de que esse valor será pago com base na alíquota de hoje.

 

Que outras cláusulas são importantes?

Fazemos um usufruto cruzado ou recíproco, que significa que na hipótese de cônjuges, casados, já fica previsto que o usufruto passa para o cônjuge e só depois para os filhos. Essa doação fica em caráter reversível. Se eventualmente o herdeiro falecer, antes do que está doando, essa operação é desfeita e o imóvel volta para o patrimônio dos pais. Já a cláusula da Incomunicabilidade dos Bens garante que o patrimônio não entrará para  noras e genros, a menos que o filho ou filha faleça e os pais também, aí sim o  cônjuge entra na herança em concorrência com os outros filhos, se for o caso. Pela cláusula da Impenhorabilidade dos Bens, os filhos não podem usar o imóvel garantia ou penhor, é uma proteção para que eventuais credores dos filhos não alcancem o patrimônio.

 

Como se garantir?

Por isso é sempre bom, quando for fazer doação ou inventário, conversar com um advogado que conheça essa parte, caso contrário os advogados podem transferir no valor da declaração ou no valor atualizado de mercado e paga-se um imposto alto e desnecessário. Se é uma fazenda ou um imóvel onde funciona o negócio da família, talvez não valha a pena gastar dinheiro agora. A regra é que você pode escolher quando for doar para calcular o Imposto de Renda ou sobre o valor que está na sua declaração, e você não vai ter ganho nenhum, ou sobre o valor atualizado.

 

Os advogados da área tributária estão esperando mudanças?

A Receita Federal e a Secretaria da Fazenda estão muito bem preparadas com equipes só para ficar revendo Planejamento Sucessório e buscando formas de tributar. Se você você monta uma empresa hoje com um único imóvel e vende amanhã, o fisco vai entender como uma simulação e vai querer tributar como se a venda fosse na pessoa física. Se faz parte da rotina da família compra e venda de imóveis, e consigo comprovar isso, não é evasão. A economia é enorme e faz sentido.

 

E no caso de recursos em dinheiro?

A parte líquida é mais simples. A tributação de aplicação financeira no Brasil é muito mais barata na pessoa física do que na jurídica. Se vou investir em um fundo pela pessoa física, vou pagar em média 15%. Tem algumas tributações maiores, mas a regra é essa. Na pessoa jurídica eu pago 34%, a não ser que tenha uma empresa financeira. Quase ninguém põe dinheiro em uma holding no Brasil e não antecipa a parte do dinheiro, pois não faz sentido do ponto de vista fiscal.

 

Para o setor do agro, o planejamento também é recomendável?

Sem dúvidas, tudo o que foi dito vale para gestão de fazendas e antecipação das heranças. Mas há que se tomar alguns cuidados específicos, pois muitas vezes a apuração da base de cálculo do ITCMD é mais complexa e, além disso, há economias importantes também em relação ao ganho de capital, em relação às quais se recomenda sempre a consulta a um advogado tributarista.

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