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Um olhar mais leve e positivo para o Autismo
Após saber que sua filha mais nova estava no TEA (Transtorno do Espectro Autista), Andreia Silva iniciou uma jornada pessoal e profissional para aperfeiçoar as próprias habilidades. Formada em Administração de Empresas, mãe, mentora, palestrante sobre Saúde Mental, terapeuta integrativa e criadora do método IAP — Identificar, Atuar e Praticar, ela lançou o livro “Além do Autismo: Dicas de uma mãe atípica em busca de equilíbrio” para ajudar mães e pais de crianças com TEA a encarar o laudo a partir de um olhar mais positivo, apesar dos desafios. Na obra, Andreia dá ferramentas para criar uma conexão estreitar com a criança, saber ouvir e compreender. “Depende de nós construir um futuro com pessoas dignas, com segurança de serem quem são, valorizando-os fazer diferente para obterem resultados diferentes. Se isso for transmitido com amor, o caminho de todos será leve e feliz. Precisamos ter o olhar humanizado frente às diferenças e enaltecer cada passo, celebrar cada conquista dos nossos filhos e ter claro que eles são muito especiais”, comenta. Confira a entrevista:
Os pais ainda têm muita dificuldade para aceitar o diagnóstico?
Sim, pois não é fácil assumir que seu filho necessita de um olhar especial. Há muitos comentários julgadores que são enfrentados quando pais tentam colocar seus sentimentos para fora e não são motivados a procurar ajuda, a ter um laudo. Assim, é importante ter informação e conhecimento para sair da negação que o filho está bem para a aceitação que ele precisa de ajuda específica. Este é o primeiro grande desafio a ser superado.
Os irmãos, especialmente, sentem a diferença no tratamento?
O ideal em uma família é manter o equilíbrio. Quando a atenção tende a ir somente para um, isso irá acarretar um desequilíbrio que é sentido por todos, inclusive por aquele que tem mais atenção. Por isso, ter consciência que, além dos cuidados com a criança atípica, existem os demais integrantes da família que também precisam de espaço e atenção é muito importante. Muitas pessoas se anulam para cuidar e ser melhor para a criança atípica, mas este caminho é muito doloroso, além de influenciar diretamente na relação conjugal e com os outros filhos. E muitas vezes isso não é perceptível para os pais. O filho típico vai se fechando em seu mundo, e a separatividade na família avança e pode causar prejuízos significativos. O melhor é manter equilibradas as relações, procurando estabelecer tempos específicos com qualidade para cada integrante da família e promover atividades em conjunto para que a socialização seja igualitária, sem causar prejuízos a ninguém.
É importante para os pais reservarem um tempo para eles, não é?
Ser pais de uma criança atípica requer muita dedicação, carinho e amor. Muitas vezes, estes pais perdem a noção dos limites saudáveis e se envolvem demasiadamente em tarefas operacionais, aumentando sua carga mental de tal forma que fica difícil ter o controle da sua vida.
O que aconselha?
O autocuidado deve ser uma prioridade, pois o amor-próprio é muito importante para conseguir forças e equilíbrio na jornada de um filho atípico. Deve haver um tempo específico dedicado ao casal para que ambos saiam de uma esfera de problemas. Como por exemplo: tirar um dia da semana para ter um momento a sós pelo menos por duas horas; reservar um dia na agenda do mês para um passeio a dois; delegar funções e atividades para não se concentrar em um só; fazer uma lista de tarefas indicando quem é o responsável pela atividade etc.
Como impor limites às crianças?
Crianças, por si só, já testam os limites dos pais praticamente a todo momento. E com as crianças atípicas, isso não muda. A grande questão é que, por apresentarem algumas estereotipias, formas diferentes de se lidar são necessárias. Por isso, quando estiverem fora de casa, por exemplo, é importante sempre antecipar o que pode acontecer e como devem agir para que eles saibam como se comportar diante de situações. Combinar gestos e palavras que eles saibam interpretar também são importantes para que a comunicação seja efetiva. E com isso, os pais de crianças atípicas precisam fortalecer muito a sua saúde mental, para lidar e antecipar situações, a fim de gerar o menor desgaste possível nos relacionamentos com as crianças.
Quais são as atitudes das crianças que costumam ser mais difíceis?
No autismo, cada criança se expressa de uma forma e tem uma particularidade. Além disso, existem níveis de suporte que indicam o quanto a criança necessita de auxílio. Em geral, a irritabilidade e agressividade nas crianças são muito difíceis de se lidar. Não são todas as crianças que apresentam estas características em nível elevado, mas, geralmente, acredito que seja um exemplo de situação desafiadora que os pais podem enfrentar. Não é saudável criar os filhos em bolhas. Reprimir algumas atividades e vontades não faz bem, na minha opinião.
Mas essa compreensão pode ser difícil para as crianças, não?
Por isso, é preciso compreender o que a criança apresenta para saber orientar e direcionar o que é essencial nessas horas. Os autistas são inteligentes e, por mais que apresentem questões cognitivas e motoras, sabem compreender as orientações. Isso acontece até mesmo com os não verbais. Por isso, cultivar um relacionamento amoroso com as crianças enaltece as trocas e as conduz para serem capazes de lidar com situações que lhe tiram da rotina. Quanto mais confiantes e seguras as crianças se sentirem, melhor se sairão em ocasiões distintas.
O medo do futuro, de pensar quem vai cuidar da criança preocupa?
Eu aconselho os pais a direcionarem, educarem e conduzirem os filhos o mais próximo da realidade possível. Criar os filhos para o mundo e não em redomas de vidro ilusórias, com consciência de que todos são diferentes e únicos. Acreditar que a criança é capaz, dar condições para que ela melhore suas habilidades e motivá-la para que sempre busque o seu melhor. Cultivar bons valores e premissas para que eles tenham uma base sólida do que realmente importa na vida é necessário.
Como incentivar?
Crianças atípicas têm muitas competências. Serem tratadas com amor, respeito e compaixão, dispondo de um tempo com olhar humanizado é a melhor forma para harmonizar suas questões. Valorizar a conquista das crianças, deixá-las confiantes que elas são capazes, irá encorajá-las a mostrar as suas habilidades, e, através delas, será possível para elas seguirem com menos dependência.
Compartilhar experiências, frequentar grupos de pais, ajuda as famílias?
Sim, trocar experiências, informações e conhecimentos sempre ajuda a família a compreender cada vez mais o autismo e as necessidades do filho. Cada criança autista se expressa de uma forma única; por isso é tão particular cuidar dela. É necessário entender e saber interpretar o que ela quer te dizer, pois a mente funciona de forma diferente. Grupos de pais, grupos de estudos, interações estreitas com a escola e terapeutas que cuidam da criança vão ajudar significativamente a entender as suas necessidades e ter cada vez mais conhecimento de como agir e como fazer em situações desafiadoras.