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Adilson Luiz Gonçalves

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Sobre o Santos Export 2024 e afins

O evento InfraJur – Encontro Nacional de Direito de Logística, Infraestrutura e Transportes, realizado em 22/4/2024, durante o Santos Export 2024, em Santos, São Paulo, teve como um de seus temas de debate os impactos da precariedade de investimentos nos acessos aos portos.

A questão dos acessos aos portos também foi abordada nos painéis do Santos Export 2024, realizado entre 22 e 23/4/2024, ou seja, o tema é recorrente e tratado sob múltiplos aspectos.

No InfraJur, foi destacado o problema da instabilidade jurídica e da litigância predatória, sobretudo no que se refere a judicializações deletérias, que têm protelado e até inviabilizado empreendimentos fundamentais para o desenvolvimento econômico do Brasil. É preciso tomar medidas drásticas contra quem as pratica!

Considerando o profuso e confuso arcabouço legal brasileiro, associado à burocracia estatal e à draconiana legislação ambiental em vigor, não faltam argumentos para aqueles que, por interesse financeiro ou ideologia radical, questionam qualquer empreendimento. Assim, fica difícil promover o desenvolvimento sustentado no País. Considerando o atraso na autorização e execução de obras de infraestrutura no Brasil, é possível afirmar que vivemos um momento de estagnação e, por vezes, de retrocesso, no qual o impacto negativo de ações judiciais se une a uma espécie de ambientalismo deletério, enquanto ignora a importância de aspectos econômicos e sociais envolvidos, em função de visão e retórica enviesadas, não raro inconsequentes.

O conceito de sustentabilidade é bem mais objetivo e amplo do que o discurso do ESG. Em tese, o discurso de Environment Social Governance, como pressupõe sua descrição, propõe o equilíbrio entre temas ambientais, sociais e de gestão, como foi enfatizado no Sustenta Export – Fórum Nacional de Transição Energética no Setor de Infraestrutura, que aconteceu em 23/04/2024, também durante o Santos Export. Já o conceito mais amplo prevê o equilíbrio entre abordagens ambientais, sociais e econômicas.

A palavra-chave, nos dois casos, é “equilíbrio”! Porém, o que se vê é a predominância do tema ambiental – muito importante, sem dúvida! -; uma visão social limitada, assistencialista, pois foca majoritariamente numa parcela da população, nem sempre representando seus reais interesses, mas crenças e ideologias; e um entendimento de que a economia é sempre a “vilã” em qualquer processo.

Esse desequilíbrio pouco ou nada tem contribuído para a geração de empregos e tributos, mas não tem sido empecilho para que os avessos ao desenvolvimento efetivamente sustentado pleiteiem ou sejam suportados por recursos decorrentes da arrecadação de impostos.

Empregos são fundamentais para a solução de problemas sociais. Aliás, tendem a evitá-los, além de proporcionar dignidade e potencial para evolução social, ou seja, cidadania plena. Os tributos coletados de empreendimentos e atividades econômicas fornecem os recursos orçamentários necessários à melhoria e à expansão na prestação de serviços públicos, incluindo saúde, educação, habitação, cultura e segurança.

A solução “assistencialista” também depende da economia, pois não há como sustentar programas sociais, inclusive habitacionais, sem que os governos tenham recursos para tanto. Não basta falar em direito à habitação, pois não basta ter casa, até de forma gratuita, se não houver condições para mantê-la de forma autônoma, sem depender de bolsas governamentais, que deveriam ser temporárias. É preciso gerar empregos!

Além disso, a própria legislação atual prevê compensações na implantação de atividades econômicas, as quais podem incluir recursos para programas ambientais, sobretudo em áreas desprotegidas.

Durante o evento, foi novamente mencionado que, para executar uma nova ligação rodoviária entre o Planalto e a Baixada Santista, com foco em transporte de cargas destinadas/oriundas do Porto de Santos, seriam necessários cerca de dez anos, entre licenciamento ambiental e execução. Isso é um total e completo absurdo!

Mas também foi mencionada a deficiência na apresentação de projetos, ou seja, todos os envolvidos têm uma parcela de culpa.

A continuar esse cenário, o Brasil continuará a ser o país de um futuro que nunca chega, agora também pressionado externamente para conter seu processo de crescimento econômico. O agronegócio passou a ser considerado um vilão por alguns setores radicais, inclusive governamentais, ignorando sua importância para o PIB do País. A reindustrialização é exaltada como prioritária, mas a burocracia e a legislação ambiental permanecem como impedâncias de difícil conciliação, tantas são as restrições e interesses conflitantes.

É preciso revisar a legislação brasileira, livrando-a tanto quanto possível de conflitos, radicalismos e interpretações, mas com o cuidado de não “abrir a porteira” para exageros no trato com o meio ambiente, nem trancafiar investimentos imprescindíveis ao desenvolvimento socioeconômico do Brasil. A efetiva autonomia e autodeterminação do País dependem disso, para que a Nação possa assumir protagonismo internacional compatível com sua extensão territorial, recursos naturais e capacidade criativa e produtiva de seu povo.

Igualmente fundamental, como mencionado durante os eventos, é que haja planejamento estratégico com visão holística, de Estado, acima de interesses político-partidários, corporativos ou pressões externas.

Isso implica em considerar todas as questões logísticas que envolvem as atividades econômicas, sobretudo a infraestrutura necessária a garantir a produção e seu escoamento.

Esse entendimento foi ratificado pela assinatura de convênio de fiscalização pela Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários) e pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) para fiscalização de acessos ao Porto de Santos. Outros portos brasileiros também merecem ser objeto de convênios semelhantes, mas o complexo portuário local, o principal do Hemisfério Sul, há anos enfrenta problemas de acesso terrestre e aquaviário que tendem a comprometer sua competitividade em termos nacionais e internacionais.

É preciso investir na melhoria e na expansão da rede nacional de rodovias, ferrovias, dutovias, hidrovias, portos e aeroportos. Interesses pontuais devem ser considerados, mas não podem prejudicar o interesse de muitos, do próprio País!

No caso específico do Porto de Santos, a Ferrovia Interna do Porto de Santos (FIPS), o agendamento de caminhões e as renovações de concessões de ferrovias que acessam o Porto são ações importantes, mas de alcance limitado, pois permanece apenas um acesso rodoviário de cargas, a pista descendente da Via Anchieta.

O Governo do Estado já determinou a realização de estudos para uma nova ligação Planalto-Baixada Santista, mas o prazo estimado para sua construção é, no mínimo, problemático. Dependendo da solução, pode ser que exija investimentos adicionais em outras vias da região, com o aumento da capacidade da Rodovia Domênico Rangoni.

Também é pleiteada outra alternativa de acesso rodoferroviário ligando Suzano (SP) à Área Continental de Santos, via Rodoanel.

Afinal, as áreas para expansão das atividades portuárias, retroportuárias e industriais na região estão principalmente na Área Continental de Santos, em Guarujá, que configuram a margem esquerda do Porto de Santos, e em Cubatão, com acessos a terminais portuários públicos e privados (TUPs).

Sim! Como nos principais portos do mundo, a proximidade de atividades industriais de complexos portuários é lógica, contribuindo para a redução de custos e aumentando o valor adicionado nas suas carteiras de exportações. Portanto, tão importante como melhorar e expandir acessos terrestres, é aproximar a produção industrial dos portos e aeroportos.

A dragagem de aprofundamento do Canal do Estuário para -17 m também deve ser priorizada, de forma a permitir que o Porto de Santos esteja apto a receber de forma competitiva navios de maior porte.

Para tanto, é imprescindível investir em arranjos produtivos, pesquisa e desenvolvimento, condomínios logísticos e industriais, inclusive em Zonas de Processamento de Exportação (ZPEs) próximas a portos e aeroportos.

Foi assim que a China, com a implantação de milhares de Zonas Econômicas Especiais (ZEEs) – similares às nossas ZPEs -, alcançou a condição de segunda economia do mundo e maior produtora de patentes, com sete de seus portos entre os dez maiores movimentadores de carga conteinerizada do planeta.

A expansão da capacidade dos terminais portuários e a implantação de novos berços de atracação também é premente, para “ontem”.

A Relação Porto-Cidade também deve ser considerada não apenas como discurso ou modismo, mas com a efetiva participação dos municípios que sediam complexos portuários na elaboração de planos mestres, planos de Zoneamento e Desenvolvimento, poligonais e, porque não, do Plano Nacional de Logística.

Existem propostas tramitando no Congresso Nacional que preveem recursos para cidades portuárias, a exemplo do que ocorre com cidades que recebem royalties de petróleo e gás, mineração e água utilizada para geração de energia. Esses projetos consideram percentuais do lucro líquido das autoridades portuárias, de valores de outorga ou da arrecadação alfandegária.

Concluindo, quando se fala em desenvolvimento efetivamente sustentado, não cabe proselitismo ideológico, mas pragmatismo estratégico, considerando todas as variáveis pertinentes. Problemas sociais e ambientais só serão evitados ou mitigados com uma economia interna forte, e não com financiamento internacional que limita nosso desenvolvimento pleno, nos submetendo a interesses comerciais de corporações e países desenvolvidos.

Legislação, regulação, planejamento, gestão e investimentos fazem parte de um mesmo arcabouço, o que é uma tarefa hercúlea, quase uma quimera em termos de Brasil. Isso pode ser superado se o equilíbrio entre aspectos ambientais, sociais e econômicos que caracteriza o efetivo desenvolvimento sustentado for uma política de Estado.

Não podem haver “fios soltos” nem desconsideração da “Lei de Murphy”, o que demanda um tempo que o Brasil não tem.

Parte desse processo exige que o sistema portuário nacional, responsável por cerca de 95% da corrente comercial brasileira (aproximadamente 30% pelo Porto de Santos), os aeroportos, a implantação de condomínios logísticos e industriais (incluindo ZPEs) próximos a eles, a melhoria e a expansão de seus acessos terrestres e aquaviários e a geração e distribuição de energia sejam considerados de utilidade pública, pela geração de empregos e divisas que promovem, e por sua inquestionável importância estratégica para o Brasil.

Há interessados nacionais e internacionais em investir no Brasil, em múltiplos setores. Ao que consta, não são poucos. Mas muitos desistem ao avaliar a quantidade e tamanho dos entraves e veredas existentes por aqui.

O convênio firmado entre Antaq e ANTT é condição necessária, mas não suficiente para melhorar esse cenário.

Ainda durante o Santos Export 2024, representantes do Ministério de Portos e Aeroportos e do Ministério dos Transportes também manifestaram interesse em unir esforços em prol de melhoria dos acessos. Porém, o tema é tão importante e sujeito a externalidades, mesmo dentro do Poder Executivo Federal, que outros ministérios talvez precisem ser envolvidos nesse escopo, tais como: Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima; Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (foro das ZPEs); Ministério da Justiça e Segurança Pública; Ministério da Integração de Desenvolvimento Regional, Ministério do Planejamento e Orçamento e Ministério dos Povos Indígenas. Cada um tem uma parcela a colaborar, o que não exclui a participação dos poderes Legislativo e Judiciário.

O Brasil – principalmente seus representantes – precisa estar à altura de suas dimensões continentais e de seu povo, para realizar seus potenciais de forma plena.

Um “pacto pelo desenvolvimento sustentado” pode ser um caminho emergencial transitório, enquanto não são feitos os ajustes estruturais necessários.

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